MPF destaca desafios para proteção do patrimônio cultural em contextos de vulnerabilidade social — Procuradoria-Geral da República

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Patrimônio Cultural

5 de Agosto de 2025 às 15h10

MPF destaca desafios para proteção do patrimônio cultural em contextos de vulnerabilidade social

Tema foi debatido durante seminário promovido por Iphan e Ipea, com foco na judicialização e na garantia de direitos fundamentais

Foto mostra prédio histórico do Iphan


Foto: Acervo Iphan

Aliar a preservação do patrimônio cultural aos direitos fundamentais de pessoas em contextos de vulnerabilidade social é um dos desafios da atuação do Ministério Público Federal (MPF) na temática. A avaliação foi feita durante o seminário “Hipossuficiência e Patrimônio Cultural: uma agenda atravessada pela judicialização”. Promovido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), evento ocorre nesta segunda-feira (4) e terça-feira (5) na sede do Iphan, em Brasília.

Ao participar da mesa de abertura, a coordenadora da Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural (4CCR/MPF), subprocuradora-geral da República Luiza Frischeisen, explicou o papel do MPF na área de patrimônio cultural e apresentou casos que envolvem populações vulneráveis e bens tombados. Nesse sentido, ela ressaltou o desafio de conciliar a preservação do patrimônio com a garantia de direitos fundamentais, como a moradia. “O diálogo com as populações vulneráveis é essencial, porque entra um outro direito que é a moradia. Preservar o patrimônio sem excluir os direitos de quem vive ali é um equilíbrio que buscamos”, pontuou.

Luiza Frischeisen citou os estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Pernambuco, Bahia e Maranhão como os que mais demandam a atuação do Ministério Público Federal em questões relacionadas ao patrimônio cultural. Segundo a coordenadora 4CCR, esses estados enfrentam desafios semelhantes, decorrentes do processo de desenvolvimento urbano. Os centros históricos, antes ocupados como áreas residenciais, perderam protagonismo à medida que as cidades passaram a se expandir em direção a regiões voltadas ao comércio e aos serviços. Esse deslocamento provocou o esvaziamento desses espaços, agravado por dificuldades de manutenção dos bens históricos, problemas de sucessão, abandono, entre outros fatores. “Quando as cidades querem revitalizar seus centros históricos, surge uma questão complexa: como preservar suas características com as pessoas ainda morando lá?”, questiona Luiza.

Entre os casos recentes, o MPF apresentou uma ação na Justiça para garantir a preservação do Forte de São Paulo da Gamboa, no centro histórico de Salvador (BA), bem tombado em nível federal e ocupado irregularmente por famílias de baixa renda. O caso foi resolvido com a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) entre o MPF, a Defensoria Pública da União, o município de Salvador, o Iphan e a União. Com o acordo, parte das famílias poderá permanecer no local, respeitando critérios técnicos e o projeto de conservação. No Rio de Janeiro, São Luís, Salvador e Recife, também há ações judiciais envolvendo imóveis em centros históricos ocupados por moradia popular.

Em outros casos, após pedido do MPF, a Justiça Federal condenou o estado do Maranhão a realizar medidas emergenciais de restauração do prédio que abriga o Arquivo Público Estadual, tombado e localizado no Centro Histórico de São Luís. Em Florianópolis (SC), o MPF garantiu ainda a preservação de áreas do patrimônio histórico em obras urbanísticas no centro da cidade, assegurando que intervenções respeitem os tombamentos existentes e normas ambientais.

Outro foco de atenção são os casos nos quais as populações locais se tornam vulneráveis por terem seus modos de vida profundamente afetados por tragédias e grandes empreendimentos. Em Mariana (MG), por exemplo, o MPF acompanha a preservação de áreas tombadas afetadas pelo rompimento da barragem da Samarco. Já em Maceió (AL), o MPF atua após o afundamento de bairros inteiros, causado pela mineração subterrânea da Braskem.

Outro fator, citado por Frischeisen, que leva populações a se tornarem vulneráveis porque perdem o modo de vida é a transformação urbana que envolve a mudança de um bairro com características populares para um bairro mais valorizado e de classe média/alta, um processo chamado de gentrificação. Nesses casos, ele geralmente é acompanhado por um aumento dos preços de imóveis e do custo de vida. Isso pode levar ao deslocamento da população original, em sua maioria idosos, que muitas vezes não consegue mais arcar com os custos de moradia na região. “Esse é um fenômeno muito comum em cidades europeias, mas que já chegou ao Brasil. Manter o patrimônio histórico, atrair o turismo e manter os direitos dessas pessoas é uma equação que precisa ser equilibrada”, lembrou a coordenadora da 4CCR.

Durante a apresentação, Frischeisen pontuou ainda a importância da articulação com outros órgãos do MPF, como a Câmara de Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais (6CCR) e a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), além de outras instituições, como Iphan, Ibama, Ipea e Polícia Federal.

Judicialização e acordos – Ao destacar o papel do Ministério Público no controle das políticas públicas e na proteção do patrimônio histórico e cultural, Frischeisen destacou o trabalho nas esferas judicial e extrajudicial para garantir que o desenvolvimento urbano respeite o patrimônio e os direitos fundamentais da população. Na proteção do patrimônio histórico e cultural, o MPF atuou em 383 processos e procedimentos relacionados a atos lesivos nos últimos cinco anos, entre 2020 e 2025. Desse total, são 41 ações civis públicas (ACPs) apresentadas pelo órgão.

Luiza Frischeisen destacou, no entanto, que apesar de atuar por judicialização – apresentando ações à Justiça – o MPF tem atuado de forma mais efetiva termos de ajustamento de conduta.

Em dois dias de debates, representantes de órgãos públicos, pesquisadores, juristas, movimentos sociais e gestores de políticas culturais discutem sobre a hipossuficiência – nas dimensões social, econômica, jurídica, técnica e territorial — e os desafios impostos à proteção do patrimônio cultural. O objetivo do seminário é construir diretrizes e parâmetros para a atuação das instituições na formulação de políticas públicas mais sensíveis às desigualdades e à diversidade sociocultural do país.

Além do MPF, também participaram da mesa de abertura o presidente do Iphan, Leandro Grass; a presidente do Ipea, Luciana Servo; a deputada federal Erika Kokay; a juíza federal Ana Carolina Vieira e a procuradora-geral federal Adriana Maia Venturini, represente da Advocacia Geral da União (AGU).

Casos emblemáticos – No Rio de Janeiro, o MPF busca transformar o antigo prédio do Dops, que foi símbolo da repressão durante a ditadura militar, em um centro de memória voltado à defesa dos direitos humanos. A proposta é resgatar a história e valorizar a justiça de transição. Também no estado fluminense, o MPF atua para garantir a preservação do conjunto arquitetônico conhecido como Avenida Modelo, ameaçado de deterioração. O prédio, que inclui casas operárias nos fundos, estava em risco de deterioração. A ação foi motivada pelo descumprimento de decisão judicial que determinava a preservação do bem cultural.

Em João Pessoa (PB), o MPF recomendou a suspensão de licenças para projetos urbanísticos na comunidade tradicional da praia da Penha. A medida busca proteger o território e o patrimônio cultural, religioso e ambiental da comunidade pesqueira que, há gerações, mantém práticas culturais reconhecidas como símbolos da identidade da cidade, como a Romaria da Penha e a procissão de São Pedro Pescador.

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Fonte MPF