Direitos do Cidadão
13 de Novembro de 2024 às 18h48
STJ autoriza o plantio de variedade da cannabis para fins medicinais e farmacêuticos
Decisão permite importação de sementes e cultivo no país do cânhamo industrial para produção de remédios
Foto: Erin Stone/Pixabay
Seguindo posicionamento defendido pelo Ministério Público Federal (MPF), a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) autorizou a importação de sementes e o plantio de cânhamo industrial (hemp) no Brasil, uma variedade da cannabis destinada a fins medicinais e terapêuticos. Com teor de até 0,3% de Tetrahidrocanabinol (THC) em sua composição, o cânhamo não tem efeitos psicotrópicos, o que inviabiliza o uso recreativo. Além disso, a planta apresenta maior concentração de canabidiol (CDB), substância que não causa dependência e é utilizada no tratamento de doenças graves como epilepsia, esquizofrenia, dores crônicas, Parkinson e Alzheimer, entre outras. A permissão para cultivo do cânhamo em território nacional deve reduzir o custo dos medicamentos derivados da cannabis no país.
A decisão do STJ não autoriza a importação de sementes e o plantio de cânhamo por pessoas físicas nem usos industriais da matéria-prima diversos dos farmacêuticos e medicinais. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a União deverão fixar as regras necessárias para a atividade no prazo de seis meses da publicação do acórdão.
Histórico do processo – O assunto foi discutido no Recurso Especial 2.024.250/PR. O processo se originou de pedido da empresa DNA Soluções em Biotecnologia, que tentava autorização para importar sementes de hemp e cultivar a planta no Brasil, com o objetivo de produzir os insumos destinados a medicamentos. O caso chegou ao STJ depois que os pedidos da empresa foram negados pela primeira e segunda instâncias do Judiciário. Por causa da grande relevância e do interesse público da matéria, foi instaurado o Incidente de Assunção de Competência (IAC) n° 16. O instrumento uniformiza a jurisprudência do STJ, cria precedentes que devem ser observados pela própria Corte e demais instâncias do Judiciário, o que evita decisões conflitantes numa mesma matéria. No curso do processo, o STJ também realizou audiência pública para discutir o tema.
Posição do MPF – No julgamento, o subprocurador-geral da República Aurélio Rios enfatizou que o processo não discute aspectos criminais relativos ao plantio, posse e uso de entorpecentes proibidos por lei, não permite o cultivo amplo, geral e irrestrito da maconha, não aborda a descriminalização das drogas nem autoriza qualquer uso recreativo da planta. O caso foca na autorização para importação de sementes e plantio do cânhamo no Brasil com o intuito de produzir os insumos destinados à confecção de remédios. O consenso científico mundial demonstra que as variedades de cannabis com baixa concentração de THC não produzem efeitos psicoativos e servem apenas para uso medicinal, terapêutico ou industrial.
Plantio para uso farmacêutico – O MPF destacou que, embora a Anvisa autorize a produção e venda de remédios à base de cannabis no Brasil, as empresas brasileiras só podem fabricar os medicamentos se importarem a matéria prima, uma vez que o plantio no país não é regulamentado. Isso eleva os custos dos produtos, tanto para o consumidor quanto para o Sistema Único de Saúde. Muitas famílias precisam entrar com ações na Justiça para conseguir os remédios via SUS. Dados do Ministério da Saúde mostram que, entre 2015 e 2023, mais de US$ 33 milhões foram gastos com importação de produtos à base de cannabis para atender a determinações judiciais.
Direito à saúde – Outra via de acesso é o pedido de autorização judicial para cultivo doméstico da planta para uso medicinal. Os casos têm crescido ao longo dos anos e, segundo o próprio STJ, aumentaram 168% entre 2019 e 2023, o que revela a importância do tema. Algumas famílias e pacientes ainda desistem do tratamento tendo em vista os custos e as dificuldades envolvidas, com ofensa ao direito à saúde, como pontuou o MPF. “Especialmente sob a perspectiva do direito à saúde, o plantio de variedades da Cannabis sativa, com fins medicinais, é medida de interesse público, que importará em real impacto na vida de pessoas cuja terapia convencional não responde a contento”, defendeu o subprocurador-geral.
Promoção da saúde – O MPF também sustentou que o plantio controlado, com fiscalização adequada, de variedades da cannabis para fins de promoção da saúde está amparado na legislação nacional, nos tratados internacionais que tratam do tema e na jurisprudência do próprio STJ. Falta apenas a atuação do Poder Público para regulamentar a matéria, e a inércia nesse campo tem impedido o exercício do direito à saúde pelos cidadãos de baixa renda. A omissão regulatória abre espaço para que o Poder Judiciário possa determinar, em caráter excepcional, a implementação de políticas públicas para o cumprimento de deveres previstos na Constituição, sem violação ao princípio da separação dos poderes.
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Fonte MPF