Seminário no Pará aponta necessidade de proibir exportação de gado vivo e de mais fiscalização até proibição — Procuradoria da República no Pará

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Meio Ambiente

7 de Outubro de 2025 às 19h51

Seminário no Pará aponta necessidade de proibir exportação de gado vivo e de mais fiscalização até proibição

Especialistas e autoridades defendem o fim da atividade inconstitucional e cobram maior presença de órgãos de fiscalização federais

Montagem com quatro fotos: dois homens e uma mulher falando ao microfone, e uma plateia atenta a uma apresentação com texto sobre o "Navio Haidar".


Fotos: Camila Sousa

O seminário “10 anos depois: o naufrágio do navio Haidar”, realizado nesta segunda-feira (6) em Barcarena (PA), concentrou debates sobre a urgência de proibir a exportação de gado vivo por via marítima no Brasil e, até que essa proibição seja alcançada, exigir o aumento da fiscalização e a implementação de rigorosas medidas regulatórias.

Promovido pela Promotoria de Justiça de Barcarena, organização não governamental Mercy For Animals (MFA), Comissão de Direito Animal da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Pará (OAB-PA) e Ministério Público Federal (MPF), o evento chamou a atenção para os impactos do desastre de 6 de outubro de 2015, que vitimou quase 5 mil bois vivos e despejou 700 toneladas de óleo no rio Pará, causando um dos piores desastres ambientais da história do Pará.

Participantes do seminário classificaram a exportação de animais vivos como um ato de crueldade e que, portanto, é inconstitucional. O entendimento é que essa atividade é intrinsecamente problemática do ponto de vista do bem-estar animal e acarreta elevados riscos ambientais, sanitários, sociais e econômicos.

Segundo a responsável pelo Departamento Jurídico da MFA na América Latina, Paula Cardoso, as chances de uma nova tragédia como a do naufrágio do navio Haidar ocorrerem aumentaram muito, porque este ano o Brasil se tornou o maior exportador de bovinos vivos do mundo e, desse total, 66,4% da atividade está concentrada no porto de Barcarena.

O presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Animais da OAB-PA, Wellington Santos, destacou que os animais de exportação não têm proteção jurídica e que a mudança na lei federal é necessária para que eles obtenham direitos. “A crueldade é visível no olhar e no cheiro desses animais. Em viagens que duram em média 20 a 30 dias em alto mar, eles estão expostos a fezes, urina e doenças. Muitos animais não chegam ao local de destino e são triturados e jogados ao mar”, ressaltou.

O estresse térmico foi abordado no seminário como um dos fatores mais cruéis da exportação de animais vivos, sendo considerado o pior sofrimento para os animais durante o transporte marítimo. Essa condição de crueldade é imposta pelo confinamento em embarcações descritas como “caixas de metal com pouca ventilação”, onde os animais são submetidos ao sol escaldante e a altíssimas temperaturas. Como resultado desse estresse, muitos animais morrem durante a viagem e são lançados ao mar.

Mais fiscalização e barreiras – Enquanto a proibição total é considerada a melhor solução, o promotor de Justiça Márcio Maués, titular da 1ª Promotoria de Justiça do Meio Ambiente, da Infância e Juventude de Barcarena, apresentou propostas concretas que visam aumentar o controle sobre a atividade:

  • Exigência de licenciamento ambiental: foi instaurado um procedimento para exigir da Secretaria de Estado de Meio Ambiente, Clima e Sustentabilidade (Semas) o licenciamento ambiental para a atividade de exportação de animais vivos. A Constituição estabelece a necessidade de realização de estudo de impacto ambiental e licença para atividades potencialmente lesivas ao meio ambiente, e a atividade é considerada lesiva, registra Maués.
  • Inclusão no Termo de Ajuste de Conduta (TAC) da Carne Legal: o membro do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) informou que foi proposta a inclusão da Companhia Docas do Pará (CDP) e da Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Pará (Adepará) no TAC da Carne Legal, do MPF. O objetivo é vincular a exportação à obrigatoriedade da comprovação da origem lícita dos animais, verificando se foram criados em áreas sem desmatamento ilegal, sem trabalho escravo, e sem invasões a unidades de conservação ou a terras indígenas ou quilombolas.
  • Regulamentação municipal do trânsito: segundo Maués, há planos para propor aos Poderes Executivo e Legislativo municipal que regulamentem o trânsito e a permanência de carretas com animais vivos em Barcarena, para garantir a ausência de poluição do meio ambiente e a integridade da população, tendo em vista o mau cheiro, as fezes, e os riscos de acidentes.

A ausência de fiscalização efetiva foi um ponto criticado no evento, onde foi apontado que os órgãos federais de fiscalização, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e a Marinha, não se fazem presentes de forma permanente em Barcarena.

Um desastre que não acabou – Para a comunidade de Barcarena, o naufrágio é uma página que ainda não foi virada. A carcaça do navio Haidar permanece no fundo do rio, simbolizando a persistência do problema. A vice-prefeita do município, Cristina Vilaça, destacou que a presença dos destroços mantém um berço de atracação da CDP inativo há dez anos, gerando perdas econômicas para o estado.

Lideranças comunitárias e moradores relataram os impactos contínuos do desastre e da atividade de exportação. Pescadores afirmaram que o pescado diminui a cada ano e que algumas espécies desapareceram. Ribeirinhos denunciaram a contaminação da água, que causa problemas de pele em crianças e adultos, e a insuficiência do fornecimento de água potável. “Não é a gente que está acabando com a natureza. Alguém tá destruindo e alguém vai ter que pagar por isso. Infelizmente somos nós que estamos pagando até agora”, desabafou uma moradora.

O representante da Associação dos Barraqueiros da Praia de Vila do Conde, Henrique Nery Carvalho, lembrou que o turismo na região, uma importante fonte de renda, foi drasticamente afetado e nunca se recuperou totalmente. Além disso, a comunidade convive diariamente com os transtornos causados pelas carretas que transportam os bois, como mau cheiro e o risco de acidentes fatais na rodovia.

Crime, não acidente – A vereadora de Belém Marinor Brito foi enfática ao classificar o naufrágio como um crime. “Isso não é acidente: colocar essa quantidade de animais em um navio sem a menor condição de segurança”, afirmou. Paula Cardoso, da MFA, explicou que a atividade foi transferida do porto de Belém para Barcarena após uma ação judicial motivada pelo impacto no turismo da capital. “A conta foi transferida para Barcarena e hoje quem convive com isso são vocês”, alertou aos presentes.

O promotor de Justiça Márcio Maués reforçou o risco de novas tragédias, explicando que os navios utilizados não são adequados para o transporte de animais. “Não existe navio adequado ao transporte de animais. A propensão a acidentes com esses navios é muito maior do que com navios comuns”. Segundo a MFA, essas embarcações, muitas vezes velhas e adaptadas, têm o dobro de chances de naufragar em comparação com a frota mercante padrão.

Ao final do evento, o membro do MPPA informou que, além das medidas já em andamento, será redigida uma carta com os encaminhamentos do seminário e que será dada continuidade ao diálogo com os órgãos responsáveis para implementar as propostas de maior controle e fiscalização.

Importância da participação – A MFA incentivou a comunidade a atuar como testemunha ocular, registrando, por fotos e vídeos, flagrantes de maus-tratos no transporte terrestre e problemas de saúde e ambientais para munir o Ministério Público. A MFA também divulgou o abaixo-assinado pelo fim da exportação de animais vivos no endereço exportacaovergonha.com.br

 

Ministério Público Federal no Pará
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Fonte MPF