Direitos do Cidadão
20 de Março de 2025 às 15h30
Seminário debate avanços e desafios na garantia dos direitos das mulheres no Brasil
Especialistas e autoridades ressaltam necessidade de ações concretas para combater a violência e garantir a efetiva aplicação das leis
Foto: Elio Rizzo/Secom/MPF
“Apesar das leis que garantem a igualdade de direitos entre homens e mulheres, as violações contra esse princípio continuam a ser recorrentes e precisam ser combatidas”. Com essa declaração , a procuradora federal dos Direitos do Cidadão adjunta, Ana Padilha, abriu o seminário “Vozes de Mulheres”. Realizado nesta terça-feira (18), na sede da Procuradoria-Geral da República em Brasília (DF), o evento reuniu autoridades e especialistas para discutir ações concretas de promoção dos direitos das mulheres.
O debate idealizado pelo Grupo de Trabalho Igualdade de Gênero da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadãos (PFDC) revelou a urgência de um combate mais eficaz à violência contra as mulheres. As participantes destacaram os avanços obtidos nos últimos anos com a aprovação de leis que as protegem, mas chamaram atenção para as lacunas que ainda existem na efetiva implantação dessa legislação.
Durante a abertura, Ana Padilha reforçou que o Brasil, como signatário da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, tem o compromisso de assegurar os direitos femininos. Também ressaltou a importância de superar o silêncio e a invisibilidade que recai sobre muitas mulheres, frutos de uma cultura de apagamento que tem raízes profundas e estruturais na sociedade. “Esses silêncios não são acidentais. Eles são produto de estruturas antigas e resistentes que limitam a participação das mulheres, especialmente das que enfrentam múltiplas formas de exclusão”, alertou a procuradora adjunta.
Nesse contexto, de garantir o direito das mulheres, a coordenadora do GT de Igualdade de Gênero, Márcia Morgado, abordou as principais frentes de atuação do grupo, destacando a relevância de ações concretas para garantir a efetividade das leis existentes. Criado em 2024, o grupo tem como objetivo monitorar a implantação das políticas públicas relacionadas ao tema, buscando sempre a conformidade com a legislação brasileira e com compromissos internacionais, como a Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher e o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável número 5 da ONU, que trata da igualdade de gênero.
A coordenadora destacou uma ação específica que tem ganhado maior destaque: a Lei do Minuto Seguinte, sancionada em 2013, que estabelece o atendimento obrigatório e integral, por parte dos hospitais da rede Sistema Único de Saúde (SUS), às vítimas de violência sexual, independe de registro de ocorrência policial. “Trabalhamos intensamente para conscientizar tanto as mulheres quanto as autoridades sobre os direitos garantidos por essa lei”, afirmou Márcia Morgado.
Espaços de poder – Já a coordenadora do Grupo de Trabalho (GT) de Enfrentamento e Prevenção da Violência Política de Gênero do Ministério Público Eleitoral, Raquel Branquinho, enfatizou a importância da luta pela representatividade feminina no campo político e eleitoral. Ela ressaltou que, apesar das mulheres representarem a maioria da população brasileira, elas continuam sendo minoria no campo político, o que impacta diretamente na falta de representatividade feminina nas câmaras municipais, assembleias estaduais e no Congresso Nacional.
“Temos um problema estrutural nas instituições, incluindo o sistema de Justiça, que muitas vezes não consegue identificar ou tratar as situações de violência política que afastam as mulheres dos espaços de poder”,explicou Raquel Branquinho. O GT busca não apenas enfrentar as violências políticas, mas também impulsionar a reforma do sistema de Justiça, incluindo advocacia, Ministério Público, Poder Judiciário e a polícia, para garantir que a violência contra as mulheres não seja perpetuada ou minimizada.
Preconceito – Durante o evento, as palestrantes destacaram os obstáculos ainda maiores enfrentados por mulheres negras, indígenas e LGBTQIA+, que precisam afirmar constantemente sua presença e competência. “É necessário que todos nós possamos fazer com que nossa voz seja amplificada”, reforçou a secretária-geral do Ministério Público da União (MPU), Eliana Torelly. Ela lembrou que, apesar das vitórias, a luta por igualdade e respeito permanece constante.
A presidente da União Brasileira de Mulheres, Maria das Neves Sá de Macedo Filha, apresentou índices alarmantes de feminicídio no Brasil, com um recorte ainda mais grave para mulheres negras. “Em 2021, 67% das mulheres assassinadas no Brasil eram negras. Precisamos de um Judiciário que entenda a urgência de efetivar legislações que visam proteger as mulheres”, afirmou Maria das Neves.
Ela lembrou o assassinato da imigrante venezuelana Julieta Hernández, ocorrido no Amazonas e que até hoje não foi reconhecido oficialmente como feminicídio pelo Judiciário local. “Precisamos de um país onde todas as mulheres, independente de sua classe social, raça ou nacionalidade, tenham acesso à justiça”, concluiu.
A assessora de Inclusão e Diversidade do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Samara Pataxó, também chamou atenção para os desafios enfrentados pelas mulheres indígenas. Ela lembrou que está em trâmite o Projeto de Lei 4381/23, que estabelece procedimentos específicos para o atendimento de mulheres indígenas vítimas de violência, levando em conta as particularidades culturais desse grupo.
Conquistas e desafios – Em uma reflexão sobre os desafios e avanços na luta pela igualdade de gênero, Ana Carolina Querino, representante da ONU Mulheres, lembrou que o ano de 2025 marca a celebração de conquistas importantes: os 50 anos do Dia Internacional das Mulheres, os 30 anos da Plataforma de Ação de Pequim e os 25 anos da Resolução 1325 sobre Mulheres, Paz e Segurança. Para Ana Carolina, esses marcos são lembretes não apenas dos progressos conquistados, mas também dos desafios persistentes enfrentados pelas mulheres em todo o mundo.
“Trinta anos atrás, pouco mais de doze países tinham leis voltadas para o enfrentamento da violência contra as mulheres. Hoje, são mais de 1.500 iniciativas legislativas nesse tema ao redor do mundo”, ressaltou Ana Carolina. Apesar dos avanços, ela alertou que a desigualdade de gênero persiste em diversos aspectos, como a participação das mulheres no mercado de trabalho. “Estamos há 20 anos estagnadas no mercado de trabalho e no que diz respeito à paridade política. Alguns países conseguiram incluir a paridade em suas constituições, mas na média, o progresso é muito limitado”, afirmou.
Mercado de trabalho – A inserção das mulheres no mundo trabalhista foi tema do painel apresentado pela juíza do trabalho e auxiliar da Presidência Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Wanessa Mendes de Araújo. Segundo ela, apenas 47,8% das mulheres em idade laboral compõem a força de trabalho brasileira, sendo que esse cenário é ainda mais crítico para mulheres negras. Nesse universo, as mulheres ainda enfrentam múltiplos desafios, como a diferença salarial de aproximadamente 20% em relação aos homens. Além disso, elas dedicam, em média, 21 horas semanais aos afazeres domésticos (dez horas a mais que os homens), sendo que são as principais provedoras de seus lares, mesmo recebendo menos.
A palestrante ressaltou que serão necessários 174 anos para atingir a paridade de gênero global. Nesse contexto, segundo ela, têm papel fundamental as políticas afirmativas e os protocolos com perspectiva de gênero adotados no sistema Judiciário para combater essas desigualdades.
Lei Maria da Penha – O combate à violência contra a mulher foi abordado no painel apresentado pela secretária municipal de Políticas Públicas para Mulheres de Jaú (SP), Cândida Magalhães. Ela chamou atenção para a falta de ações preventivas. “Estatísticas revelam um aumento contínuo da violência contra a mulher. Nós temos a Lei Maria da Penha, que é a terceira melhor legislação do mundo, mas somos o quinto país que mais mata mulheres. O porquê disso? inexpressivas políticas de prevenção, porque falamos tão pouco de prevenção em termos de políticas públicas”, frisou.
Já a promotora de Justiça Dulcerita Soares afirmou que 45% das mulheres vítimas de violência não denunciam os agressores, principalmente devido à falta de provas ou ao medo de não serem ouvidas. Ela ressaltou a urgência de fortalecer as redes de proteção às mulheres, que, apesar da existência de legislações avançadas, ainda são insuficientes para garantir a segurança das vítimas de violência.
A violência digital contra mulheres foi tema da palestra da diretora da Safernet, Juliana Cunha, que apresentou dados sobre a violência online. Segundo ela, a plataforma Safernet recebeu quase 5 milhões de denúncias nos últimos 18 anos, com 818 mil páginas removidas por irregularidades detectadas. As denúncias revelam o aumento do discurso de ódio, da misoginia e dos casos de “stalking” e da divulgação não consensual de imagens íntimas. “Cerca de 47% das mulheres não denunciam as violências sofridas”, afirmou Cunha, ressaltando a necessidade de fortalecer as redes de proteção e a educação digital como ferramentas cruciais para o combate à violência on-line.
Acesse a gravação do evento transmitido pelo Canal do MPF no YouTube.
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Fonte MPF