Direitos do Cidadão
14 de Outubro de 2025 às 15h25
Projeto de lei que aumenta internação de adolescentes é grave retrocesso, afirma PFDC
Em nota técnica, órgão do MPF aponta inconstitucionalidade em projeto que estende internação socioeducativa para até 10 anos
Foto: CNJ
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgão do Ministério Público Federal (MPF), manifestou-se de forma contrária ao projeto de Lei (PL) nº 1.473/2025, que propõe tornar mais rigorosas as regras da medida socioeducativa de internação no Brasil. O projeto propõe alterações substanciais na Lei nº 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA) e no Decreto-Lei nº 2.848/1940 (Código Penal).
Em nota técnica, a PFDC classifica o texto aprovado na última quarta-feira (8), na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal, como um grave retrocesso jurídico e social, incompatível com a Constituição Federal e as diretrizes internacionais. Para o procurador federal dos Direitos do Cidadão, Nicolao Dino, “o Projeto de Lei nº 1.473/2025 constitui um retrocesso normativo grave no campo da proteção integral da infância e da adolescência, ao alterar de forma substancial a arquitetura jurídica e principiológica que estrutura o sistema socioeducativo brasileiro”.
O cerne da crítica reside no fato de que o novo texto do projeto de lei desvirtua a natureza pedagógica e ressocializadora do ECA, aproximando-o de um modelo essencialmente punitivo, próprio do sistema penal adulto. Nesse sentido, segundo a PFDC, as alterações propostas comprometem pilares fundamentais da justiça juvenil e da doutrina da proteção integral.
Entre as principais modificações propostas para o ECA está a supressão do princípio da brevidade. Com isso, o período máximo de internação seria ampliado de três para cinco anos. Esse prazo poderia chegar a dez anos em casos de atos infracionais praticados com violência, grave ameaça à pessoa, ou equiparados a crimes hediondos. O documento aponta que a proposta também visa reduzir o controle judicial, ampliando o intervalo da reavaliação judicial de semestral para anual.
Impactos – Sob a perspectiva internacional, o projeto afronta a Convenção sobre os Direitos da Criança (CDC), ratificada pelo Brasil, que estabelece que a privação de liberdade deve ser utilizada apenas como último recurso e pelo período mais curto possível. Para a PFDC, portanto, o texto ignora os compromissos assumidos pelo país. Nicolao Dino reforça que “a ampliação dos prazos e a exclusão do princípio da brevidade subvertem a função reparadora e educativa da medida, deslocando-a para uma dimensão repressiva, típica do sistema penal de adultos”.
Para além das implicações jurídicas, a nota aponta a irresponsabilidade fiscal da medida, uma vez que a ampliação da internação, aliada à redução do controle judicial e à ausência de análise de impacto orçamentário, acentuará a crise estrutural e de direitos humanos que já acomete o sistema socioeducativo, agravando a superlotação, bem como os riscos de tortura e violência institucional. Com um menor apreendido ficando mais tempo internado, haverá uma redução drástica na rotatividade e um aumento de risco de colapso no sistema socioeducativo.
Processo legislativo no Senado – O PL nº 1.473/2025, de autoria do senador Fabiano Contarato, já passou pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) e teve seu substitutivo, relatado pelo senador Flávio Bolsonaro, aprovado na CCJ na semana passada, onde tramita em caráter terminativo (dispensa de ser votado no Plenário). A matéria está em pauta para ser votada novamente na CCJ nesta quarta-feira (15), em turno suplementar. Se aprovado e não houver recurso para votação no Plenário, o projeto seguirá diretamente para a Câmara dos Deputados.
Fonte MPF