Direitos do Cidadão
8 de Agosto de 2025 às 16h20
PFDC aponta falhas na Lei de Alienação Parental e defende revisão para garantir proteção integral de crianças e adolescentes
Em nota técnica, órgão do MPF aponta que a norma não é clara, apresenta problemas jurídicos práticos, e inconstitucionalidades
Imagem: Freepik
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgão do Ministério Público Federal (MPF), emitiu nota técnica sobre a Lei nº 12.318/2010, conhecida como Lei da Alienação Parental. Para a PFDC, embora a norma tenha surgido com a intenção legítima de proteger vínculos familiares, seu conteúdo apresenta inconstitucionalidades, problemas jurídicos e práticos, que vêm comprometendo a efetiva proteção de crianças e adolescentes — especialmente em contextos de violência doméstica e de gênero.
O documento aponta que a lei não é clara, usa termos vagos e subjetivos e não possui critérios objetivos, o que tem gerado decisões judiciais inconsistentes e inseguras. Isso tem resultado em uma aplicação distorcida da norma, que muitas vezes desloca o foco da proteção da criança para disputas entre os adultos. “Pesquisas sobre as sentenças proferidas em processos que discutem alienação parental apontam considerável discrepância interpretativa entre tribunais sobre o que efetivamente configura alienação parental, como deve ser combatida e quais os limites e disparidades da legislação”, reforça o procurador federal dos Direitos do Cidadão, Nicolao Dino.
A lei define como alienação parental atos que interfiram na formação psicológica da criança para que ela rejeite um dos genitores ou familiares próximos. Entre os exemplos listados estão: dificultar o contato com o outro genitor, omitir informações importantes, fazer falsas denúncias ou desqualificar o outro genitor perante a criança. Em casos com indícios desses atos, a legislação permite ao juiz adotar medidas imediatas, como alterar a guarda, suspender visitas ou impor acompanhamento psicológico.
A nota da PFDC aponta, porém, que a aplicação dessas medidas, muitas vezes sem investigação aprofundada, tem provocado consequências graves: rompimento abrupto de vínculos afetivos, sofrimento psíquico e instabilidade emocional em crianças. A avaliação é a de que a norma viola os princípios da proteção integral e prioritária e do melhor interesse da criança e do adolescente e o princípio da vedação à proteção insuficiente. Além disso, também fragiliza garantias fundamentais como o contraditório, a ampla defesa e o devido processo legal, ao permitir sanções com base apenas em indícios.
Revitimização – Outro ponto levantado na nota técnica é o uso crescente da alegação de alienação parental por genitores acusados de violência doméstica, sobretudo homens, como estratégia para deslegitimar denúncias feitas por mulheres. Diversas instituições, como o Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), o Conselho Federal de Psicologia (CFP), a Defensoria Pública da União (DPU) e organismos da Organizações das Nações Unidas (ONU), já alertaram que a lei tem sido usada para revitimizar mães e crianças, ao tratá-las como agressoras em vez de protegê-las.
“Nessas situações, em vez de serem protegidas, elas passam a ser tratadas como autoras de um suposto comportamento alienador, sujeitando-se a sanções judiciais severas — como a inversão da guarda, suspensão de visitas e imposição de acompanhamento psicológico compulsório — mesmo antes da apuração dos fatos denunciados”, detalha Dino.
Estudos citados no documento demonstram que, ao invés de pacificar disputas familiares, a legislação tem acirrado os conflitos, contribuindo para o silenciamento de vítimas e o enfraquecimento da rede de proteção. A ausência de salvaguardas claras para casos de violência doméstica permite interpretações equivocadas que colocam crianças em risco de reaproximação forçada com agressores.
Processo Legislativo – A PFDC também destaca a fragilidade do processo legislativo que originou a lei, elaborado sem audiências públicas amplas ou participação técnica especializada. Segundo o órgão, a falta de escuta aos segmentos responsáveis pela proteção da infância comprometeu a qualidade e a legitimidade da norma, que não atende de forma adequada aos compromissos constitucionais e internacionais assumidos pelo Brasil.
Diante das inconstitucionalidades apontadas, a PFDC defende a revisão da norma, com base em diálogo democrático, escuta técnica qualificada e respeito aos direitos humanos, para garantir que o sistema de justiça cumpra seu papel de proteger, e não revitimizar, crianças, adolescentes e suas famílias.
Atuação – O tema não é novo na PFDC. Em março de 2020, a PFDC se manifestou, também em nota técnica, sobre o Projeto de Lei nº 498/2018, que tramitava no Senado Federal com a proposta de revogação da Lei de Alienação Parental. Na ocasião, o órgão apontou que a legislação apresentava fragilidades para alcançar os objetivos propostos, além de possíveis inconstitucionalidades.
De acordo com a PFDC, a questão permanece atual, porque subsistem os problemas e impasses, que até se agravam com o passar do tempo de vigência da lei. Ao longo dos últimos cinco anos, o órgão do MPF acompanhou o tema e os novos projetos de lei relacionados à alienação parental, como o PL 1.372/2023 (no Senado Federal) e os PLs 2.812/2022, 3.179/2023 e 1.841/2024 (na Câmara dos Deputados). Nesse contexto, reforça seu posicionamento sobre as inconstitucionalidades contidas na norma.
Em maio deste ano, a PFDC realizou audiência pública para discutir os impactos e desafios da Lei da Alienação Parental. O evento reuniu especialistas e representantes da sociedade civil, ampliando o espaço de diálogo e promovendo uma análise crítica sobre a legislação e sua aplicação.
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Fonte MPF