Eleitoral
10 de Julho de 2024 às 8h50
Orientação busca garantir cumprimento das cotas de gênero e das políticas afirmativas raciais nas Eleições 2024
Texto assinado pelo vice-PGE lembra que fraudes podem configurar violência política e devem ser combatidas pelo MP Eleitoral com prioridade
Arte: Comunicação/MPF
O vice-procurador-geral Eleitoral, Alexandre Espinosa, expediu orientação aos procuradores e promotores que atuam na fiscalização das Eleições 2024, para assegurar o cumprimento das cotas de gênero e das políticas afirmativas raciais na disputa municipal. O documento traz as recentes alterações legislativas e de jurisprudência sobre o tema para nortear a atuação do Ministério Público em todo o país na fiscalização do cumprimento dessas normas pelos partidos e candidatos. Quando identificada a fraude, o texto orienta que os procuradores e promotores atuem tanto na esfera cível-eleitoral quanto no campo criminal, para responsabilizar os envolvidos, respeitada a independência funcional dos membros do Ministério Público.
O objetivo é assegurar a efetividade das políticas afirmativas para maior participação de mulheres e pessoas negras na política e nos cargos eletivos. A legislação eleitoral obriga os partidos a destinarem às mulheres ao menos 30% das candidaturas apresentadas para disputar o cargo de vereador. Além disso, o tempo de propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão e o financiamento de campanha com recursos provenientes de fundos públicos devem ser divididos de maneira proporcional para contemplar candidaturas de mulheres e de pessoas negras. O descumprimento dessas regras, além de gerar aplicação de sanções na esfera eleitoral – como a cassação de mandato e inelegibilidade – pode ter consequências na esfera criminal, se ficar caracterizada a prática de violência política.
Na orientação, o vice-PGE lembra que os integrantes do MP Eleitoral devem estar atentos às decisões recentes tanto do Supremo Tribunal Federal (STF) quanto do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre a matéria, “realizando a interpretação das políticas afirmativas eleitorais de gênero e raça a partir de uma perspectiva antidiscriminatória”. A orientação foi enviada aos procuradores e procuradoras regionais eleitorais nos estados, que deverão encaminhá-la aos promotores e promotoras eleitorais, responsáveis pela fiscalização direta do pleito municipal.
Cota de gênero – Embora a cota de gênero nas eleições proporcionais (para vereador e deputado) esteja prevista na legislação brasileira desde 1997 como forma de estimular a participação das mulheres na política, são frequentes fraudes como lançamento de candidaturas fictícias, falta de financiamento para campanhas femininas ou de tempo mínimo de propaganda, o que acaba tornando as candidaturas inviáveis. Em maio deste ano, com o objetivo de conferir efetividade à norma, o TSE aprovou a Súmula 73 – com base em tese defendida pelo MP Eleitoral de forma reiterada na Corte – que traz parâmetros a serem adotados pela Justiça Eleitoral em todo o país para identificar e punir fraudes à cota de gênero.
Votação zerada ou inexpressiva para as candidatas, prestação de contas zerada, padronizada ou falta de movimentação financeira relevante na campanha e ausência de atos efetivos de divulgação ou promoção da candidatura feminina são indicativos de fraude, que devem ser investigados pelos promotores e procuradores eleitorais. Outros parâmetros que auxiliam na identificação da irregularidade são a desistência tácita das candidatas, a apresentação de candidaturas manifestamente inviáveis e a ausência de substituição de candidatas dentro do prazo legal.
Quando comprovada a fraude à cota de gênero, todos os votos recebidos pelo partido são anulados e o Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (Drap) cassado. Todos os candidatos eleitos pela chapa podem perder seus mandatos, independentemente de prova de participação, ciência ou anuência no ato ilícito. A conduta ainda resulta na inelegibilidade de quem praticou ou concordou com o ato e na recontagem dos quocientes eleitoral e partidário para redistribuição das vagas entre os demais partidos.
Candidaturas negras – A orientação lembra ainda que a Emenda Constitucional nº 111/2021 estabelece que, até 2030, os votos dados a mulheres e pessoas negras para a Câmara dos Deputados contam em dobro para fins de divisão de valores de fundos eleitorais (Fundo Partidário e Fundo Especial de Financiamento de Campanha) a serem repassados aos partidos políticos. Ao mesmo tempo, o STF determinou a distribuição proporcional de recursos públicos de campanha e do tempo de propaganda eleitoral às candidaturas negras dentro de cada gênero.
Em dezembro, o Ministério Público Eleitoral emitiu recomendação a todos os partidos com os parâmetros a serem seguidos para o cumprimento dessas normas. Também cabe às legendas adotarem políticas de prevenção e responsabilização de fraudes no âmbito da identificação de candidaturas negras.
Embora o critério da autoidentificação seja a melhor ferramenta, uma vez que possui presunção de veracidade, segundo o vice-PGE, nada impede que os partidos mantenham comissões de heteroidentificação próprias, funcionando de forma complementar à autodeclaração, a exemplo do que fazem as universidades e bancas organizadoras de concursos públicos. Para evitar ilícitos e garantir que os objetivos de políticas afirmativas sejam alcançados, as comissões devem ter composição plural e membros com letramento racial, além de trabalhar com foco no respeito à dignidade do ser humano, ao devido processo legal e à garantia de publicidade que permita o controle social.
Violência política – Na orientação aos procuradores e promotores, Espinosa lembra ainda que as fraudes às cotas de gênero e às políticas afirmativas raciais podem configurar violência política, “uma vez que acarretam a deslegitimação de grupos em razão de suas características inerentes, com a finalidade de impedir ou de dificultar a sua campanha eleitoral ou o desempenho de mandato eletivo”. Recentemente, a Lei nº 14.192/2021 tipificou como crime a violência política cometida por motivo de gênero e raça, prevendo penas que variam de um a quatro anos de prisão ao agressor. Conforme protocolo firmado com o TSE, crimes relacionados à violência política devem ser investigados e processados com prioridade pelo Ministério Público.
Fonte MPF