Indígenas
20 de Novembro de 2025 às 19h55
COP30: MPF, povo Xikrin e médico denunciam ecocídio do Rio Cateté (PA) e contaminação por metais pesados
Especialistas apresentaram dados alarmantes sobre a saúde das famílias impactadas pelo empreendimento Onça Puma, da Vale

Foto: Comunicação/MPF
O Ministério Público Federal (MPF) promoveu, nesta quinta-feira (20), no estande da instituição na Zona Verde da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), em Belém (PA), o debate “A morte do Rio Cateté, ação de saúde e Onça Puma”. O evento reuniu procuradores da República, especialistas em saúde, representantes e lideranças do povo Xikrin do Cateté para expor a grave crise ambiental e sanitária que afeta as comunidades indígenas no sudeste do Pará, decorrente da atividade de mineração de níquel.
O debate foi apresentado pelo procurador da República Igor Spindola, que atua na região de Marabá, e pelo procurador da República Rafael Martins da Silva. Spindola relembrou o histórico judicial do caso e destacou que, embora a justiça tenha reconhecido os danos e determinado indenizações, o problema central persiste: o rio continua morto. “O rio permanece contaminado. Estamos no desafio da descontaminação e da reparação, garantindo o direito de existência dos indígenas em seu território”, destacou o membro do MPF.
Lento etnocídio – Um dos pontos altos do debate foi a apresentação técnica do médico e doutor pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) João Paulo Botelho Vieira Filho, que acompanha a saúde dos Xikrin há décadas. Botelho apresentou dados chocantes de estudos realizados com 720 indígenas: 99,7% da população Xikrin do Cateté examinada apresenta pelo menos um ou mais elementos químicos em excesso no organismo.
No total, 32 elementos químicos foram encontrados em excesso, sendo 22 metais. Desses, sete são listados como extremamente tóxicos, incluindo mercúrio, chumbo, alumínio, bário e titânio. Crianças de um a dez anos estão 100% intoxicadas por um ou mais metais.
O médico descreveu o cenário como um ecocídio (destruição do rio) seguido de um lento etnocídio (destruição da etnia indígena). Segundo ele, antes do início da mineração do projeto Onça Puma, em 2009, o rio era transparente e cheio de vida. Hoje, o Rio Cateté e o Rio Itacaiúnas são considerados “rios mortos”.
Os efeitos na saúde da população são devastadores. Botelho relatou e exibiu imagens de casos de:
• Malformação fetal grave (incluindo casos de sirenomelia, ou síndrome da sereia);
• Doenças neurológicas semelhantes ao Parkinson em jovens e crianças;
• Problemas de locomoção e rigidez muscular;
• Cânceres raros e doenças autoimunes;
• Dermatites severas após contato com a água.
“A Vale não contribui com medicina preventiva. Se não for interrompido o lançamento de rejeitos minerais, os Xikrin irão morrer”, alertou o médico, criticando ainda as ações de greenwashing [o ato ou a prática de fazer com que um produto, política, atividade, etc., pareça mais ecologicamente correto ou menos prejudicial ao meio ambiente do que realmente é] da empresa, como o plantio de árvores que, segundo ele, não resolvem a contaminação da água que o povo bebe e utiliza.
O clamor dos Xikrin – Diversas lideranças indígenas tomaram a palavra para expressar a dor de ver seu modo de vida destruído. O cacique Karangré Xikrin relembrou a época de fartura de peixes e água limpa, contrastando com a realidade atual de dependência de água mineral e alimentos industrializados.
Um momento de forte emoção ocorreu durante a fala da representante das mulheres Xikrin. Traduzida por uma liderança jovem, ela relatou o sofrimento das mães que veem seus filhos nascerem com deformidades ou natimortos. “Não temos mais alegria. Nossos filhos nascem doentes, nossos velhos estão morrendo. Queremos que a Vale pare de nos matar”, desabafou a liderança feminina.
O jovem cacique Kaiorê Xikrin reforçou que a luta não é apenas por dinheiro, mas pela sobrevivência física e cultural do seu povo. “O Rio Cateté é a nossa vida, é o nosso supermercado, é a nossa farmácia. E hoje ele é veneno”, disse.
Ações jurídicas e futuro – O procurador da República Rafael Martins, que também atuou no caso, explicou que existem duas frentes de batalha judicial: uma focada no empreendimento e outra especificamente na saúde indígena. Atualmente, há uma suspensão de seis meses no processo para tentar construir, junto com a empresa e a comunidade, um plano efetivo de recuperação do rio, algo que o MPF considera inegociável.
O advogado da comunidade, Robert Alisson Rodrigues, reforçou a necessidade de atualização do Plano Básico Ambiental (PBA) para incluir o monitoramento e a descontaminação como prioridades absolutas.
Assim, o evento na COP30 serviu como uma vitrine global para denunciar que, apesar dos discursos de sustentabilidade presentes na conferência, comunidades tradicionais na Amazônia continuam sendo vítimas diretas de grandes projetos de exploração mineral.
O MPF informou que a ação civil pública segue em curso, buscando obrigar a mineradora Vale a custear o tratamento de saúde vitalício para os afetados e a executar a limpeza da bacia do Rio Cateté.
Ministério Público Federal no Pará
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Fonte MPF


