MPF pede que órgãos ambientais criem plano para frear crise hídrica e devastação no entorno do Parque Nacional Grande Sertão Veredas — MPF-MG de 1º grau

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Meio Ambiente

13 de Novembro de 2025 às 13h40

MPF pede que órgãos ambientais criem plano para frear crise hídrica e devastação no entorno do Parque Nacional Grande Sertão Veredas

Sobrecarga no uso de recursos hídricos ameaça o Cerrado e já há redução significativa nas veredas, imortalizadas na obra de Guimarães Rosa

Foto de uma grande vereda sob o céu azulado


Parque Nacional Grande Sertão Veredas – Foto: Arquivo ICMBio

O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou uma ação com pedido de urgência para assegurar a proteção do Parque Nacional Grande Sertão Veredas (PNGSV) e do Cerrado. A ação demanda uma reforma estrutural na gestão ambiental e hídrica para enfrentar o grave risco de declínio ecológico que ameaça a unidade de conservação, localizada na divisa dos estados de Minas Gerais e Bahia, e seus arredores, devido ao desmatamento e à utilização excessiva dos recursos hídricos disponíveis.

A ação foi ajuizada contra a União, a Agência Nacional de Águas (ANA), o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o estado de Minas Gerais, a Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam), o Instituto Estadual de Florestas de Minas Gerais (IEF/MG), o Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), o estado da Bahia e o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Bahia (Inema), responsáveis pela gestão e fiscalização ambiental e hídrica nas esferas federal e estadual.

O MPF demanda que as instituições elaborem e implementem um Plano Estrutural Regional integrado para a recuperação e preservação da região. Este plano deve abordar as falhas sistêmicas de governança, incluindo, mas não se limitando, a unificação dos critérios técnicos para outorga de água, conciliando os limites de retirada entre ANA, Igam e Inema, a fim de evitar sobrecarga hídrica.

A reestruturação exige, ainda, a adoção de metodologias que integrem o cálculo de disponibilidade de águas superficiais e subterrâneas, eliminando a duplicidade de volumes concedidos. Além disso, o plano deve estabelecer a criação de um polígono de segurança hídrica no entorno do parque, incorporar a avaliação climática nos procedimentos de concessão de outorgas e supressão de vegetação, e vincular a renovação de outorgas à apresentação de dados de monitoramento do uso efetivo da água

Foto de pessoas durante caminhada em meio ao cerrado
Foto: Lia Rezende Domingues/Agência Brasil

Ameaça ao Grande Sertão – O Cerrado, onde o parque está inserido, tem sofrido uma devastação intensa, sendo o bioma com a maior área desmatada no Brasil pelo segundo ano consecutivo, chegando a 52,5% do total nacional em 2024. Municípios próximos ao parque, como Arinos e Chapada Gaúcha (MG), estão entre os mais desmatados do estado.

Estudos técnicos e investigações do MPF confirmaram que a unidade e a região estão enfrentando uma situação crítica devido aos efeitos cumulativos do desmatamento e do uso excessivo de água em seu entorno imediato. A conversão de áreas nativas para a agropecuária de larga escala resultou na queda significativa da disponibilidade hídrica, com rios e veredas registrando redução de até 50% em suas vazões. As veredas, que são cruciais para manter os rios perenes, estão se retraindo, comprometendo o abastecimento de água superficial e subterrânea.

A degradação tem impactos severos e visíveis. Reportagens recentes documentaram o desaparecimento das veredas imortalizadas na obra do escritor Guimarães Rosa, bem como a morte de animais da fauna silvestre, como lobos-guarás, que caíram afogados em canais de irrigação desprotegidos.

Reforma estrutural – A principal causa do problema apontada pelo MPF é a fragmentação institucional e a falta de integração entre os diversos órgãos responsáveis pela gestão ambiental e hídrica. A ANA, o Igam e o Inema, responsáveis pela outorga de água, utilizam critérios técnicos distintos e concedem autorizações separadamente para águas superficiais e subterrâneas. Isso gera uma “duplicidade de oferta”.

Pessoas com redes dentro de um lago repleto de folhas e cercado por vegetação do cerrado“A quantidade de água que ainda consegue infiltrar no Cerrado nativo pode não ser suficiente para abastecer, simultaneamente: as demandas das outorgas de uso da água [e] o funcionamento hidrológico das veredas. Essas duas demandas passaram a concorrer pelo mesmo recurso, a água infiltrada”, afirma a ação.

De forma semelhante, os órgãos estaduais de florestas, como o IEF/MG e o Inema/BA, têm concedido autorizações de desmatamento sem consultar previamente o ICMBio, que é o órgão federal gestor do parque.

A ação proposta pelo MPF não busca apenas reprimir um ato específico, mas sim uma reforma estrutural. O objetivo é reconfigurar as práticas desses órgãos, exigindo que eles atuem de forma coordenada para compatibilizar o desenvolvimento econômico com a preservação ambiental.

Para viabilizar essa reestruturação e estancar a degradação até que o Plano Estrutural Regional integrado seja elaborado e implementado, o MPF pede liminarmente que os órgãos ambientais paralisem temporariamente a concessão de novas autorizações de uso de água e de supressão de vegetação nativa no entorno do parque.

COP30 – A ação judicial ocorre em um momento estratégico, no momento em que o Brasil sedia a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30). O Cerrado é vital para a regulação do clima e da segurança hídrica nacional, pois suas cabeceiras abastecem rios importantes, como o São Francisco e o Pantanal.

O procurador da República Lauro Coelho Junior ressalta que a ação “por sua natureza estrutural, não deixa de ser um convite ao Poder Judiciário, ao Ministério Público e às partes indicadas como requeridas para que contribuam para o alcance de metas almejadas pela COP-30, no limite de suas responsabilidades, no que tange à uma gestão sustentável do uso da água e do solo não só no entorno do Parque Nacional Grande Sertão Veredas, mas no bioma Cerrado como um todo.”

Processo 6390271-43.2025.4.06.3800.

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Fonte MPF