Meio Ambiente
1 de Dezembro de 2025 às 11h55
MPF pede anulação de licença ambiental prévia da Etapa 4 do pré-sal
Para expandir produção na área, empreendimento deve realizar consulta prévia a comunidades tradicionais e complementar estudo ambiental

Foto: Divulgação
O Ministério Público Federal (MPF) quer que a Justiça Federal determine a imediata anulação da licença ambiental prévia emitida à Petrobras em setembro para ampliação das atividades de exploração de óleo e gás na Bacia de Santos. O pedido faz parte de duas ações civis públicas ajuizadas contra a empresa e órgãos federais envolvidos no processo de licenciamento da chamada Etapa 4 do pré-sal, entre eles o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
O MPF destaca que a autorização recentemente concedida resultou de um procedimento administrativo instaurado sem transparência e conduzido às pressas pelo Ibama, além de desconsiderar impactos que podem colocar em risco o meio ambiente e a existência de comunidades tradicionais nos litorais norte paulista e sul fluminense. O MPF também pede que o Ibama e a União sejam proibidos, desde já, de emitir quaisquer novos atos administrativos relacionados à Etapa 4 até que grupos de pescadores artesanais, caiçaras, quilombolas e indígenas da região sejam consultados e se manifestem sobre o empreendimento.
A realização de consulta prévia a comunidades tradicionais é uma condição para que órgãos públicos e empreendedores deem sequência a projetos e medidas que possam afetá-las diretamente. A obrigação está definida na Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que vigora no país há mais de 20 anos com status de norma constitucional. O tratado estabelece que essa consulta deve se dar de forma livre e basear-se em informações completas e transparentes, para assegurar às comunidades a participação ativa em processos decisórios que envolvam seus direitos e sua integridade.
O projeto da Etapa 4 do pré-sal está em desenvolvimento há cinco anos, mas até agora nenhuma consulta nos moldes da Convenção foi efetivamente feita às comunidades do litoral de São Paulo e do Rio de Janeiro. Para resolver a pendência, o MPF pede nas ações que a União, o Ibama, a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) sejam imediatamente obrigados a apresentar, em até 60 dias, um plano de realização dessas reuniões, sob coordenação do Ministério da Casa Civil e com garantia de participação dos grupos tradicionais em sua formulação.
Impactos – Ao final da tramitação processual, o MPF requer que a sentença definitiva imponha aos réus não só o dever de executar a consulta às comunidades, mas também a obrigação de elaborar um Estudo de Impacto Ambiental (EIA) complementar que inclua os potenciais danos do projeto ignorados ou subestimados até aqui. Segundo um relatório do Observatório de Territórios Sustentáveis e Saudáveis da Bocaina (OTSS), o licenciamento da Etapa 4 vem desconsiderando pelo menos 25 possíveis prejuízos sociais e ambientais graves relacionados à expansão das atividades petrolíferas na faixa litorânea entre os estados de São Paulo e Rio de Janeiro.
Entre esses impactos estão a perda de meios de subsistência e a redução da renda de comunidades locais – sobretudo de pescadores artesanais –, a ruptura de práticas tradicionais, riscos à segurança alimentar, a elevação da incidência de problemas de saúde e o aumento da violência. O documento do OTSS indica também falhas nos critérios adotados no EIA atual para mensuração dos possíveis danos, a exclusão de grupos tradicionais da área de influência delimitada no projeto e a ausência de avaliação sobre possíveis vazamentos de óleo a partir dos navios que transportam o produto extraído nas plataformas, uma das fases mais sensíveis da cadeia de produção.
Parte desses riscos já foi prevista pela própria Petrobras em levantamentos realizados para o licenciamento de etapas anteriores do pré-sal. Embora reconheça alguns dos potenciais impactos do novo projeto, a empresa vem propondo ações mitigadoras insuficientes para contorná-los, como o desenvolvimento de programas de educação ambiental e intenções genéricas de fortalecimento das comunidades locais.
“O empreendimento não pode prosseguir sem a realização de análises complementares aprofundadas, capazes de dimensionar adequadamente os impactos socioambientais e embasar a formulação de medidas efetivas de prevenção, mitigação e compensação, sob pena de grave violação aos direitos fundamentais das comunidades tradicionais e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado”, ressaltam as procuradoras da República Walquiria Imamura Picoli e Fabiana Schneider, autoras das ações.
O MPF pleiteia que a elaboração de um novo EIA contemple as lacunas identificadas no licenciamento em curso e, ao mesmo tempo, viabilize a revisão dos planos de emergência para vazamentos de óleo e proteção de áreas vulneráveis. A ação requer ainda a condenação da Petrobras, do Ibama e da União ao pagamento de R$ 5 milhões para indenização dos danos morais que as omissões vêm causando às comunidades tradicionais da região.
Má-fé – A Etapa 4 do pré-sal compreende a instalação de dez novas plataformas na bacia de Santos, com a perfuração de 132 poços em águas profundas. Estima-se que as unidades produzirão diariamente 123 mil m³ de petróleo e 75 milhões de m³ de gás natural, em média. O processo de licenciamento ambiental do projeto teve início em 2021 e, desde então, o MPF vem cobrando, por meio de medidas extrajudiciais, o cumprimento das obrigações da Petrobras e dos órgãos públicos envolvidos.
A recente concessão da licença prévia, no entanto, tornou necessário o ajuizamento da ação civil pública. O MPF identificou que, em setembro deste ano, o Ibama instaurou um processo paralelo de licenciamento e concluiu pela autorização do projeto em apenas 11 dias, com dispensa de qualquer complementação de estudos e providências pela Petrobras. Para Walquiria Picoli e Fabiana Schneider, o órgão ambiental agiu de má-fé com a instauração silenciosa e a tramitação expressa do procedimento.
“Sem dúvida, essa manobra administrativa visou burlar o acompanhamento do Ministério Público e da sociedade civil sobre a emissão da licença, ignorando as pendências técnicas e as exigências constitucionais e legais que estavam sendo exigidas pelo MPF”, frisaram as procuradoras.
Duas ações – Foram protocoladas duas ações perante a Justiça Federal em Caraguatatuba (SP) e Angra dos Reis (RJ). Apesar da proximidade geográfica e troca entre comunidades dos litorais norte paulista e sul fluminense, a região é extensa e complexa, com especificidades que demandam uma análise individualizada. Além disso, São Paulo e Rio de Janeiro estão sob a jurisdição de diferentes Tribunais Regionais Federais, da 3ª e da 2ª Região, respectivamente. Por isso, foi feita a opção de protocolar ações em cada uma das subseções judiciárias que abrangem a região impactada pela Etapa 4 do pré-sal.
O número das ações do MPF são:
5000783-33.2025.4.03.6135 na Subseção Judiciária de Caraguatatuba (SP).
A tramitação pode ser consultada aqui
Leia a íntegra da ação civil pública
5001719-53.2025.4.02.5111 na Subseção Judiciária de Angra dos Reis (RJ).
A tramitação pode ser consultada aqui
Leia a íntegra da ação civil pública
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Fonte MPF


