MPF obtém decisões que reconhecem a imprescritibilidade do crime de trabalho análogo à escravidão — Procuradoria Regional da República da 1ª Região

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Criminal

25 de Agosto de 2025 às 17h51

MPF obtém decisões que reconhecem a imprescritibilidade do crime de trabalho análogo à escravidão

Baseada em normas internacionais de direitos humanos, atuação do MPF sustenta imprescritibilidade do crime previsto no art. 149 do Código Penal

Foto em tons marrons mostra homens trabalhando em uma lavoura. Na imagem está escrito "Trabalho Escravo Não"


Foto: João Ripper/ cedida pela OIT

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) admitiu recursos do Ministério Público Federal (MPF) em dois processos nos quais se discute se o crime de redução à condição análoga à de escravo (artigo 149 do Código Penal) é prescritível, ou seja, se pode deixar de ser punido após o fim do prazo prescricional.

As ações têm origem em fiscalizações do Ministério do Trabalho e Emprego no Pará, realizadas em 2003 e 2004, que constataram trabalhadores em condições degradantes: sem acesso a água potável, banheiros ou alojamentos adequados, além de terem direitos trabalhistas negados e contribuições previdenciárias sonegadas.

Com essa decisão, os processos serão remetidos ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) para análise. O MPF sustenta que o crime é imprescritível por se tratar de grave violação a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH) e às decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).

Segundo o MPF, a escravidão e suas formas contemporâneas constituem graves violações de direitos humanos e delitos de Direito Internacional com status de jus cogens (normas imperativas). A jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, de caráter vinculante para o Brasil, firmou que tais crimes não prescrevem. O país reconheceu a jurisdição da CIDH, ao ratificar a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica).

A instituição destaca que o Brasil incorporou a CADH ao ordenamento interno (Decreto nº 678/1992), garantindo-lhe hierarquia supralegal, conforme entendimento do STF (RE 466.343). Assim, as regras prescricionais do Código Penal não podem se sobrepor às normas internacionais que vedam a prescrição de violações graves.

Entenda os casos – Em março, o procurador regional da República Danilo Pinheiro Dias recorreu de decisão da 10ª Turma do TRF1 que reconheceu a prescrição de crime praticado na fazenda Bom Jardim, em São Félix do Xingu (PA), onde 23 trabalhadores foram encontrados em situação análoga à escravidão. Para Dias, considerar o crime prescritível viola a Convenção Americana de Direitos Humanos, a Constituição Federal e o Código Penal.

Em julho, o TRF1 admitiu os recursos do MPF e destacou a relevância jurídica do tema, já em análise no STF na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1053, proposta pelo próprio MPF, que busca o reconhecimento de que o crime pode ser processado a qualquer tempo. O pedido inclui liminar para que juízes e tribunais se abstenham de declarar a prescrição até o julgamento final da ADPF.

Em junho, o procurador regional da República Bruno Caiado de Acioli também recorreu contra acórdão da 3ª Turma do TRF1 que declarou a prescrição em caso de condenação de um fazendeiro por manter 118 trabalhadores em condições degradantes. As vítimas viviam em barracos improvisados de galhos e lona, sem água potável ou banheiros, muitas próximas a fornos e fumaça, e tiveram direitos trabalhistas negados e contribuições previdenciárias sonegadas.

Para Acioli, a prescrição da pretensão punitiva do Estado para o crime de redução à condição análoga à de escravo é inadmissível, em razão da existência de normas internacionais já internalizadas e vigentes no ordenamento brasileiro, com status de hierarquia superior (supralegal). Além disso, a imprescritibilidade se impõe por se tratar de violação grave a direitos humanos, conforme decisão da CIDH, proferida no caso da Fazenda Brasil Verde. O TRF1 admitiu os recursos, citando jurisprudência do STJ favorável à tese defendida, bem assim invocando a existência da ADPF 1053/DF.

Histórico dos casos 

Maio a setembro de 2004 – Fiscalizações do MTE em três fazendas no Pará identificam 118 trabalhadores em condições degradantes (processo nº 0000453-83.2008.4.01.3901).

Junho e julho de 2003 – Fiscalização em São Félix do Xingu (PA) constata 23 trabalhadores em situação análoga à escravidão (processo nº 0000084-21.2010.4.01.3901).

Abril de 2023 – PGR ajuíza a ADPF 1053 no STF, defendendo a imprescritibilidade do crime de trabalho escravo.

Março de 2025 – PRR1 interpõe recursos contra decisão que reconheceu prescrição no processo nº 0000084-21.2010.4.01.3901.

Junho de 2025 – PRR1 interpõe recursos no processo nº 0000453-83.2008.4.01.3901, sustentando a imprescritibilidade.

18 de junho de 2025 – TRF1 admite recursos no processo nº 0000453-83.2008.4.01.3901.

1º de julho de 2025 – TRF1 admite recursos no processo nº 0000084-21.2010.4.01.3901.

Atualmente – Processos seguem para STF e STJ para análise e julgamento.
 
Ação penal nº 0000453-83.2008.4.01.3901
Recurso Especial nº 0000453-83.2008.4.01.3901
Ação penal nº 0000084-21.2010.4.01.3901
Recurso Extraordinário nº 0000084-21.2010.4.01.3901
ADPF 1053 (https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=6609169)

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Fonte MPF