Comunidades Tradicionais
8 de Abril de 2025 às 18h41
MPF obtém decisão que protege comunidade tradicional ameaçada por fazenda de criação de camarões na Paraíba
Justiça proíbe proprietário de exercer pressões sobre posse das casas e determina retomada da regularização fundiária das moradias
Foto: reprodução de imagem postada no perfil da comunidade no Instagram (@nossaterra_canaa)
A pedido do Ministério Público Federal (MPF), a Justiça Federal na Paraíba impôs uma série de medidas protetivas urgentes em benefício da comunidade tradicional Canaã, localizada no município de Santa Rita, na região metropolitana de João Pessoa (PB). A decisão em caráter liminar visa defender os moradores da pressão do novo proprietário da Fazenda Reunidas Cumbe, um empresário do ramo da carcinicultura (criação de camarões em cativeiro).
A ordem judicial determina que o empresário se abstenha de adotar qualquer conduta que pressione os moradores quanto à permanência nas casas que ocupam há décadas, como a exigência de contratos de aluguel. Ele também está proibido de impedir o acesso da comunidade a espaços coletivos essenciais à vida social e cultural local, como a praça da vila e as margens do Rio Paraíba, e deverá remover uma cerca que obstrui a circulação no local.
Além disso, o proprietário da fazenda deverá permitir a entrada na área de servidores públicos das três esferas de governo e de funcionários de empresas prestadoras de serviços públicos, como Energisa e Cagepa, sempre que estiverem atuando em função de suas atribuições relacionadas ao caso ou à prestação de serviços de interesse da comunidade. Caso descumpra qualquer dessas determinações, o réu estará sujeito a multa de R$ 2 mil por ocorrência ou por dia de descumprimento.
Outro ponto importante da decisão judicial é a ordem dirigida ao município de Santa Rita para que retome imediatamente o processo administrativo de regularização fundiária das moradias da comunidade Canaã. A prefeitura deverá informar mensalmente à Justiça o andamento do procedimento, sob pena de multa diária de R$ 500, a partir do 31º dia sem atualização.
Conflito histórico – A comunidade Canaã tem raízes profundas na história da antiga Usina Santa Rita. Formada por trabalhadores da usina e seus familiares, a comunidade nasceu como uma vila operária nas décadas passadas. Com a falência do empreendimento em 1991, os moradores permaneceram nas casas, mesmo sem receber as verbas rescisórias a que tinham direito. Muitos relataram ter feito acordos verbais de permanência como compensação pela perda dos empregos e dos direitos trabalhistas.
Desde então, a cada venda da propriedade rural, os moradores são obrigados a reafirmar seu direito à posse das casas e enfrentam novas tentativas de expulsão. Com a chegada do novo proprietário, em 2022, e a instalação de um empreendimento de carcinicultura, a pressão sobre a comunidade aumentou. Segundo relatos de moradores e apuração do MPF, houve tentativas de forçar a assinatura de contratos de aluguel, ofertas de compra de casas por valores irrisórios, demolição de muros, impedimento de melhorias nos imóveis e até escavação de viveiros de camarão próximos a edificações históricas da comunidade, como a igreja e a caixa d’água.
A instalação da atividade também tem provocado sérios impactos ambientais, como o lançamento de efluentes no Rio Paraíba, a degradação da biodiversidade local e o impedimento da prática da agricultura familiar — atividade fundamental para a subsistência das famílias.
Vulnerabilidade – Com base nesse cenário, o MPF ajuizou ação civil pública em setembro de 2024, pleiteando medidas urgentes para preservar os direitos da comunidade. A Justiça reconheceu a vulnerabilidade das famílias e deferiu não apenas as medidas protetivas, mas também a participação da Defensoria Pública da União no processo, em consonância com decisão do Supremo Tribunal Federal no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 709. “A vulnerabilidade e a desproteção jurídica dos interesses é evidente, por se tratar de demanda em que está em jogo interesse de grupo de pessoas pobres, sujeitas à perda de suas moradias e meio de vida, cujo acesso à justiça é dificultado pela informalidade da situação jurídica da comunidade”, registra a decisão judicial.
Processo: 0806908-62.2024.4.05.8200
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Fonte MPF