Indígenas
2 de Dezembro de 2025 às 19h55
MPF move ação para garantir fornecimento de água potável à Comunidade Indígena Laranjeira Nhanderu (MS)
União deve custear energia elétrica do poço artesiano e Energisa deve restabelecer o fornecimento em até 48 horas após a decisão

Foto: Freepik
O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação com pedido de urgência para obrigar a União e a Energisa Mato Grosso do Sul a resolverem a crise de abastecimento de água potável que afeta a Comunidade Indígena Laranjeira Nhanderu, do povo Kaiowá e Guarani, em Rio Brilhante (MS). A comunidade enfrenta “uma severa crise humanitária e sanitária” pela falta de água.
Em agosto, a comunidade informou ao MPF que o poço artesiano encontrava-se inoperante por falta de energia elétrica, interrompida por inadimplência, com faturas mensais entre R$600 e R$700. Como o custeio das faturas não foi assumido pelo Distrito Sanitário Especial Indígena de Mato Grosso do Sul (Dsei/MS), a população é forçada a utilizar água imprópria, dependendo de fontes alternativas e inseguras, como rios, lagoas e poços manuais, expondo crianças, idosos e doentes a riscos iminentes à saúde.
A situação persiste desde 2023 em razão de sucessivos entraves administrativos entre a União e a concessionária de energia: após solicitação do Dsei/MS, a Energisa informou, em junho daquele ano, o custo de R$ 33.245,63 para a ligação, mas suspendeu a obra dois meses depois por ausência de comprovação de titularidade da área.
Por sua vez, a União, por meio do Dsei/MS, recusou-se reiteradamente a custear a ligação e as faturas mensais, alegando ausência de homologação do território, inexistência de previsão orçamentária e atribuindo a regularização fundiária à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), o que manteve a comunidade sem acesso regular à água potável e em situação de grave vulnerabilidade sanitária.
Na análise do MPF, a própria União cria o problema, com a demora na demarcação, e o utiliza como justificativa para a omissão no atendimento do direito essencial de acesso à água potável. Ao transferir a responsabilidade administrativa para a Funai, a União acaba impondo à população indígena o ônus de sua atuação insuficiente.
Além disso, a suspensão do fornecimento por parte da Energisa ocorreu em razão da inadimplência das contas, mas a empresa tinha pleno conhecimento de que se tratava de fornecimento essencial para o sistema de abastecimento de água da comunidade indígena.
Garantia do território – Na ação, o MPF defende que a falta de homologação formal do território não pode ser utilizada como critério para negar o acesso a direitos fundamentais, especialmente em situação de emergência sanitária, e que o argumento de insuficiência orçamentária não pode se sobrepor ao dever constitucional do Estado de assegurar o direito à saúde, à dignidade da pessoa humana e à vida.
Além disso, o MPF esclarece que a Comunidade Laranjeira Nhanderu tem sua permanência amparada judicialmente há anos, na área da Fazenda Santo Antônio da Nova Esperança. Decisões judiciais de 2011 e de 2019, inclusive do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), suspenderam ordens de reintegração de posse a terceiros e garantiram a permanência dos indígenas no local, com fundamento na prioridade do direito à vida, à saúde e à dignidade humana sobre o direito de propriedade.
Condenação da União – O MPF requer, em caráter liminar, que a União assuma de forma integral e imediata a responsabilidade pelo poço artesiano já existente na comunidade e pela estrutura de reservação e distribuição de água para todas as residências.
O órgão federal deve custear todos os gastos com a energia elétrica necessária ao funcionamento do poço, incluindo o valor da ligação, estimado em R$33.245,63, e as faturas mensais. Caso a estrutura atual se revele inadequada ou insuficiente, o MPF requer que a União implante, com urgência, um sistema completo de captação, reservação e distribuição de água potável apto a distribuir água às cerca de 15 famílias que ainda não possuem abastecimento encanado. Para o caso de descumprimento, o MPF requer a fixação de multa diária de R$5 mil.
No julgamento definitivo, o MPF pede a condenação da União para assegurar, de forma permanente, o abastecimento regular de água em quantidade suficiente e com controle periódico de qualidade, por meio do Dsei/MS, enquanto perdurar a situação fundiária.
Pede, ainda, a condenação para obrigar a União a perfurar um poço dentro dos parâmetros de sua preferência, no prazo máximo de 90 dias, em caso de toda a estrutura do poço existente não estar em padrões oficiais, além da fixação de multa diária não inferior a R$10 mil em caso de descumprimento das determinações judiciais.
Condenação da Energisa – Em relação à concessionária, o MPF requer, em caráter liminar, sua condenação na obrigação a religar, no prazo máximo de 48 horas após a decisão, a energia elétrica do poço artesiano e, em até 15 dias, registrar a ligação de energia em nome do Dsei/MS.
No pedido definitivo, o MPF requer que a Energisa seja obrigada a manter o fornecimento de energia elétrica em nome do Dsei/MS enquanto perdurar a situação fundiária da área, assegurando a continuidade do serviço essencial, com a fixação de multa diária não inferior a R$10 mil em caso de descumprimento.
Precedente judicial – Para reforçar a legitimidade e urgência de seus pedidos, o MPF menciona a sentença proferida em outubro na Ação Civil Pública que tratou de situação similar na Terra Indígena Yvy Katu, no município de Japorã (MS).
Naquela decisão, a Justiça Federal reconheceu que o acesso à água é pressuposto do direito à saúde e condenou a União a fornecer, em caráter definitivo, 90 litros de água potável por dia a cada indígena. Como medida urgente, determinou ainda que, em 60 dias, a União garantisse um fornecimento de, no mínimo, 50 litros diários por pessoa, sob pena de multa diária de R$5 mil a R$200 mil.
Fonte MPF


