Indígenas
9 de Julho de 2025 às 14h55
MPF e órgãos parceiros lançam publicação com diretrizes para políticas públicas específicas aos povos indígenas de recente contato
Documento feito por GT interinstitucional tem o objetivo de valorizar e respeitar a diversidade e os modos de vida indígenas

Foto: MPF
O Ministério Público Federal (MPF), por meio da Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais (6CCR), divulgou nota técnica com diretrizes para orientar órgãos públicos na defesa dos direitos de povos indígenas de recente contato. O objetivo é fortalecer a ação institucional em contextos de grandes complexidades étnicas e culturais, onde há risco acentuado de violação de direitos dos povos de recente contato, inclusive com a possibilidade de impactos irreversíveis nos seus modos de vida.
A publicação se baseia em marcos normativos nacionais e internacionais, como a Constituição Federal, a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas e a Declaração Americana sobre os Direitos dos Povos Indígenas, para reafirmar o dever do Estado de garantir proteção especial, diferenciada e contínua a esses grupos, respeitando sua autonomia e seus modos próprios de organização social, política e cultural. O MPF, que participou ativamente da elaboração dessas diretrizes, é também um dos principais destinatários e agentes de sua implementação.
“As diretrizes são muito importantes porque historicamente o Estado e a sociedade têm muita dificuldade em se relacionar com povos indígenas de recente contato, seja por desconhecimento, preconceito, etnocentrismo ou inabilidade, já que é preciso compreender e respeitar modelos civilizatórios e lógicas diferentes de pensamento e evitar a implementação de políticas públicas massificadas e inadequadas, que desrespeitam as especificidades culturais desses grupos”, explicou o procurador da República Daniel Luis Dalberto, titular do Ofício de Povos Indígenas em Isolamento Voluntário e de Recente Contato e coordenador do Grupo de Trabalho Comunidades Tradicionais da 6ªCCR.
Diretrizes de atuação – O documento é resultado do esforço conjunto dos membros do Grupo de Trabalho Proteção Social de Povos Indígenas de Recente Contato, instituído no âmbito do Comitê Para a Promoção de Políticas Públicas de Proteção Social dos Povos Indígenas do Governo Federal. Além do MPF, o grupo contou com a participação do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), Ministério dos Povos Indígenas (MPI), Ministério da Saúde (MS), Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), e MPF.
As diretrizes para a proteção social de povos indígenas de recente contato abordam temas sensíveis e de grande impacto na vida dos povos de recente contato, como avaliação sobre as necessidades e adequações para o acesso a políticas públicas e programa sociais, os desafios ocasionados pela monetarização e acesso amplo a bens e mercadorias, o acesso e permanência nos centros urbanos, as barreiras de acessibilidades, a avaliação das reais necessidades e dos desafios para obtenção de documentação civil básica, e a garantia do direito à consulta livre, prévia e informada.
A nota orientadora reforça que a proteção social desses grupos deve ser planejada e executada de forma integrada, com pleno respeito às suas culturas, costumes e tradições. O objetivo é assegurar que as políticas públicas sejam adaptadas à realidade desses povos, prevenindo surtos de doenças, potencializados pela sua vulnerabilidade epidemiológica, evitando que a implementação e o acesso a benefícios sociais se dê de modo irrefletido, cause vulnerabilidades, perda de autonomia ou desestruturação política e social. Por isso, as ações a esses povos requerem traduções culturais, medidas protetivas especiais e acompanhamento contínuo, com atenção redobrada às políticas de saúde e à proteção territorial.
Na avaliação do MPF, o documento é uma ferramenta essencial que aprimora a compreensão e a capacidade de atuação jurídica em defesa dos direitos dos povos de recente contato. As diretrizes fornecem subsídios para a garantia da autodeterminação, a salvaguarda de seus territórios e recursos naturais, a prevenção de ações prejudiciais e a promoção da saúde e da assistência social de forma culturalmente adequada.
Quem são os povos indígenas de recente contato – Grupos que mantêm interações limitadas e descontínuas com segmentos da sociedade, os povos indígenas de recente contato, em muitos casos, sequer dominam plenamente a língua portuguesa, os mecanismos do Estado e os modos de vida da sociedade envolvente. Essas populações, que podem viver em áreas de difícil acesso, muitas vezes em regiões de fronteira ou em terras indígenas não homologadas, costumam estar em situações de alta vulnerabilidade diante da sociedade envolvente.
O Estado brasileiro os reconhece formalmente por meio da Funai, que constitui Frentes de Proteção Etnoambiental (FPEs) e Coordenações Técnicas Locais (CTLs) específicas para garantir sua proteção territorial, sanitária e cultural. O Ministério da Saúde, pela Secretaria de Saúde Indígena, também presta assistência à saúde diferenciada para os povos de recente contato, que tem maior vulnerabilidade epidemiológica. A manutenção desses serviços por pessoal especializado e capacitado, segundo o MPF, é vital para evitar que a suspensão dessas frentes cause riscos irreparáveis aos povos de recente contato.
O Brasil respeita a autodeterminação política dos povos indígenas que desejam permanecer em isolamento. O contato só pode ser feito em situações excepcionais e de risco extremo, que, quando acontece, geralmente decorre de pressões externas — como a invasão de seus territórios, a exploração ilegal de recursos naturais, impactos da mudança climática ou de projetos de infraestrutura, que ocasionam migrações forçadas.
“A diversidade cultural é patrimônio comum da humanidade e deve ser reconhecida em benefício das gerações presentes e futuras, como declarado pela Unesco. Os povos indígenas de recente contato possuem conhecimentos milenares e chegaram até aqui com a engenhosidade e autonomia de suas civilizações que sempre se relacionaram com outros povos indígenas. É uma dádiva termos essa riqueza cultural no Brasil e nosso relacionamento com esses povos deve ser pautado por simetria, trocas mútuas e por respeito aos seus desígnios, às suas práticas e saberes, pois temos a lhes ensinar mas também muito a aprender com eles”, reforçou Dalberto.
Clique aqui e confira a publicação na íntegra.
Fonte MPF