Comunidades Tradicionais
13 de Março de 2025 às 14h55
MPF defende uso da Plataforma de Territórios Tradicionais na construção de políticas públicas
Órgão participou de oficina para implementar o uso da ferramenta pelo Executivo na defesa de povos e comunidades tradicionais

Arte: Comunicação/MPF
O Ministério Público Federal (MPF) reafirmou a importância da autodeclaração dos territórios como instrumento fundamental para a garantia de direitos dos povos e comunidades tradicionais brasileiros, durante a oficina realizada pela Secretaria Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais, do Ministério do Meio Ambiente, nesta quarta-feira (12). O evento foi realizado em parceria com a Agência de Cooperação Internacional Alemã (GIZ), na sede do Ministério do Meio Ambiente (MMA), em Brasília (DF). O objetivo foi alinhar estratégias para que a Plataforma de Territórios Tradicionais (PTT) seja usada pelo Poder Executivo na criação e execução de políticas públicas voltadas a essas comunidades, a partir de parcerias com o MMA, o Ministério de Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) e o Ministério da Igualdade Racial (MIR).
A plataforma coordenada pelo MPF reúne informações georreferenciadas dos territórios autodeclarados por povos e comunidades tradicionais em todo o Brasil. Os territórios autodeclarados são áreas ainda não demarcadas pelo Poder Público, mas reconhecidas como territórios tradicionais pelos povos que nelas habitam, por razões históricas, socioeconômicas e culturais. As informações são alimentadas pelas próprias populações e validadas por um conselho gestor composto por representantes de povos e comunidades tradicionais e do MPF.
Representando o MPF no evento, o procurador da República e diretor-geral do projeto Territórios Vivos na instituição, Wilson Assis, destacou ser fundamental compreender que a posse tradicional não se confunde com outras modalidades de posse. A posse tradicional, segundo ele, é direito fundamental autônomo, assim reconhecido tanto pela Constituição Federal, quanto por tratados internacionais, como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). “O direito ao território existe antes da demarcação, sendo este um processo meramente declaratório, não constitutivo do direito dos povos e comunidades”, pontuou.
Por isso, o MPF defende a criação de um regime jurídico de proteção dos territórios não demarcados, estabelecendo obrigações para o Estado e para particulares, com o objetivo de evitar graves violações de direitos humanos e a degradação ambiental. A partir da autodeclaração das posses tradicionais, a Plataforma de Territórios Tradicionais (PTT) pretende induzir a formulação de uma política pública específica para esses territórios. “A invisibilidade ou a desconsideração sumária dos direitos territoriais dos povos e comunidades tradicionais fazem com que diversas políticas públicas continuem sendo implementadas com lesão a direitos fundamentais”, explicou Assis.
O procurador também lembrou que a autodeclaração é uma prerrogativa já reconhecida no âmbito do MPF, por meio do Enunciado n. 47 da Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais (6CCR). Esse enunciado estabelece que os procuradores do MPF devem levar em conta a autodeclaração territorial dessas comunidades quando atuam em procedimentos de reconhecimento e titulação estatal dos territórios. A normativa também estabelece que a autodeclaração precisa influenciar e induzir políticas públicas diversas, tais como as relacionadas às questões fundiárias e ambientais, devendo o MPF defender esse entendimento nas esferas judicial e extrajudicial.
Exemplo prático – Desde o ano passado, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) utiliza a Plataforma de Territórios Tradicionais para contribuir com a gestão e com o monitoramento de unidades de conservação. Agora o objetivo é ampliar essa parceria, para que outros órgãos do Executivo passem a usar a ferramenta.
“O cenário que almejamos é a implementação de uma política coerente e consistente para a proteção dos direitos territoriais de todos os segmentos de povos e comunidades tradicionais presentes no Brasil”, afirmou Wilson Assis. Para ele, há uma lacuna normativa para a proteção dos segmentos não-indígenas e não-quilombolas, situação que se soma à relativa invisibilidade dessas populações para a sociedade majoritária, quadro que precisa ser enfrentado em conjunto pelos poderes públicos.
O entendimento do procurador foi reiterado pelo antropólogo e servidor do MPF, Marco Paulo Schettino. Ele destacou que a importância da Plataforma de Territórios Tradicionais vai muito além do mecanismo digital, sendo uma ferramenta conjunta para debater o fundamento jurídico da posse tradicional. “No Brasil, prepondera o direito de propriedade individual e a posse tradicional foi e tem sido objeto de reiterados esbulhos ao longo da história. A iniciativa em torno da plataforma é a construção, junto aos parceiros, de conceitos sobre o fundamento jurídico da posse tradicional, que ainda no ordenamento brasileiro não tem uma robustez e nem se compara ao direito de propriedade privada”, esclareceu.
Fonte MPF