Comunidades Tradicionais
23 de Abril de 2025 às 15h55
MPF consegue anulação de multas de comunidade tradicional no Parque Nacional Cavernas do Peruaçu (MG)
Assunto foi tema de reuniões com o ICMBio entre 7 e 10 de abril; regularização do território e conflitos envolvendo a comunidade também estiveram em pauta
Registro da reunião com a participação de representantes da Comunidade Cabaceiras, do presidente do ICMBio e do procurador da República do MPF Edmundo Dias. Foto: ICMBio.
O Ministério Público Federal (MPF) obteve a anulação de uma série de multas ambientais que haviam sido aplicadas pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) a integrantes da Comunidade Quilombola, Pesqueira e Vazanteira de Cabaceiras, localizada em Itacarambi, norte de Minas Gerais. O anúncio do cancelamento de parte dos autos de infração foi feito durante reunião que contou com a presença do presidente do ICMBio, Mauro Oliveira Pires, na sede do instituto, em Brasília, em 7 de abril. O restante das multas ainda está em análise pelo órgão, que deve concluir em breve as revisões pedidas pelo MPF.
Além do encontro do dia 7, outras reuniões entre a Comunidade de Cabaceiras e o ICMBio ocorreram entre os dias 7 e 10 de abril. Outros temas foram debatidos durante os encontros como a regularização fundiária do território tradicional, conflitos e episódios de assédio contra a comunidade.
Por ter seu território tradicional sobreposto pelo Parque Nacional Cavernas do Peruaçu, membros da comunidade foram, desde 2017, multados pelo ICMBio, em razão da prática de atividades relacionadas aos seus modos tradicionais de vida e à sua cultura.
O pedido para que essas autuações fossem anuladas foi apresentado pelo MPF em abril de 2023, em documento no qual o procurador Edmundo Antonio Dias argumenta que as multas aplicadas à comunidade são incompatíveis com a Constituição Federal e com convenções internacionais. O requerimento do MPF aponta que a gestão das unidades de conservação deve ser compatibilizada com os direitos culturais e territoriais das comunidades tradicionais.
Para o procurador da República Edmundo Dias, “não apenas a biodiversidade, mas também a diversidade cultural, constituem valores protegidos pela Constituição Federal e por tratados internacionais, dos quais o Brasil é signatário, como a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho, a Convenção sobre a Proteção e a Promoção da Diversidade das Expressões Culturais e a Convenção para a Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial.”
O requerimento também destaca que o próprio ICMBio já reconheceu, por meio do despacho nº 635/2021 e do parecer n. 175/2021/CPAR/PFEICMBIO/PGF/AGU, a necessidade de compatibilização dos usos tradicionais com a proteção ambiental. No entanto, tal orientação nunca havia sido aplicada no Parque Nacional Cavernas do Peruaçu, situação que é acompanhada pelo MPF em uma ação judicial e em inquérito civil.
A liderança comunitária Marinalva Mendes da Rocha, presidente da Associação dos Povos Tradicionais Quilombola, Pesqueira e Vazanteira de Cabaceiras, destaca que “o processo de anulação das multas representa uma grande vitória da Comunidade, pois é uma luta que decorre desde o ano de 2017”.
Regularização fundiária – As reuniões contaram com a presença de representantes da comunidade, do ICMBio, da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e do procurador da República Edmundo Dias. Além das anulações, os encontros trataram da necessidade urgente de regularização fundiária do território tradicional, da continuidade do processo de construção coletiva de termos de compromisso com o ICMBio, que estabeleçam as atividades que podem ser realizadas pela comunidade tradicional, e da fiscalização ambiental na região do Parque. As medidas fazem parte de uma estratégia mais ampla de construção de soluções pactuadas que garantam a proteção socioambiental da região e os direitos da comunidade tradicional.
A liderança comunitária Marinalva Mendes da Rocha destacou, em ofício enviado ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e ao ICMBio, a importância do canal de diálogo estabelecido com o ICMBio, com a mediação do MPF. “Embora a atuação do ICMBio já tenha sido truculenta e arbitrária em outros momentos, inclusive mediante a derrubada de casas e barracos e a aplicação de multas aos comunitários por conta de suas moradias e cultivos, atualmente essa instituição estabeleceu um canal de diálogo, provocado e mediado pelo MPF, o que tornou possível a análise (em andamento) da nulidade dessas multas, bem como novos arranjos e cooperações entre Comunidade e ICMBio”, afirma, no documento.
Sobre a regularização do território da comunidade, alguns encaminhamentos resultaram da reunião realizada, em formato presencial e virtual, em 10 de abril. Entre eles, medidas relacionadas à conclusão da delimitação das áreas de domínio da União ao longo do trecho do Rio São Francisco que corre em Minas Gerais, o que se encontra em andamento em decorrência de outra ação proposta pelo MPF. Tal ação busca dar cumprimento ao que prevê a Constituição Federal, que determina que são bens da União, entre outros, os terrenos marginais aos rios federais.
Ação Civil Pública 1001530-56.2022.4.01.3825
Inquérito Civil 1.22.000.003736/2022-31
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Fonte MPF