Comunidades Tradicionais
24 de Abril de 2025 às 16h20
MPF celebra encerramento de exposição sobre o Quilombo da Marambaia no Rio de Janeiro
Fomos ouvidos de uma forma que nunca passou pela minha cabeça”, afirmou griô da comunidade
Arte: Comunicação/MPF
O Ministério Público Federal (MPF) promoveu um evento que celebrou o encerramento da segunda exposição do Memorial da instituição, localizado na sede da Procuradoria da República no Rio de Janeiro (PR/RJ). “Quilombo da Marambaia: do ‘ficar bom’ ao ‘ficar bem’” ficou em cartaz entre agosto de 2024 e fevereiro de 2025 e recebeu mais de 500 visitantes.
O evento, que foi realizado no fim de março, foi composto por duas mesas de discussão. Entre elas, ocorreu a apresentação de uma roda de jongo, uma dança tradicional da diáspora africana, especificamente oriunda da região em que hoje fica a Angola. O jongo é marcado pelo ritmo do caxambu, um espécie de tambor cerimonial. No meio da roda, os dançarinos, homens e mulheres, rodam a saia e arrastam os pés ao ritmo do tambor e das palmas.
Muitos moradores do quilombo estavam presentes no evento: de griôs – os mais velhos e conhecedores das tradições orais e práticas da comunidade – a pequenas crianças. “Essa exposição é muito importante. Não é só a visibilidade, mas sim porque podemos ver que a nossa resistência e continuidade estão dando frutos” diz Bárbara Guerra, quilombola. Ela destacou ainda a importância de “ver que os nossos rostos, nossos corpos estão sendo respeitados em uma exposição tão importante como essa, e a nossa história escrita nessas paredes dentro de um ambiente federal.”
Primeira mesa – Na primeira mesa do evento, foi lembrado o processo de Assinatura de um termo de ajustamento de conduta (TAC) entre a Marinha, que detém o controle do território da Restinga da Marambaia, e a comunidade quilombola. O acordo foi assinado em 2014. A mesa contou com a presença da secretária-geral do MPF e coordenadora da Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais (6CCR), Eliana Torelly, a coordenadora da Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural (4CCR), Luiza Cristina Frischeisen, do procurador-chefe da PR/RJ, Sérgio Pinel, e o procurado-chefe da Procuradoria Regional da República da 2ª Região (PRR2), Leonardo Cardoso de Freitas. Completaram ainda a mesa a a griô do Quilombo da Marambaia e curadora da exposição, Vania Guerra, e o comandante-geral do Corpo de Fuzileiros Navais, almirante de esquadra Carlos Chagas.
O procurador-chefe da PR/RJ, Sérgio Pinel, falou sobre a importância de exposições como essa: “As exposições do Memorial servem exatamente para isso. Para que nós possamos não só conhecer a história do Ministério Público Federal, a história da nossa atuação, que é uma história riquíssima, mas também para que a gente possa trazer temas que, às vezes, disputam agenda com outros. E a celebração do TAC, relacionado ao Quilombo da Marambaia, acabou sendo um espelho para outras comunidades originárias”.
O procurador-chefe da PRR2, Leonardo de Freitas, definiu o TAC como um modelo de resolução de conflitos: “Um caso paradigmático que pode ser usado como modelo no Brasil, não só na questão quilombola, como em outras questões também, prova de que com um pouco de boa vontade a gente pode fazer e resolver essas questões”, afirmou o procurador.
Para a griô Vania Guerra, que também participou da abertura da exposição em agosto, o evento representa um momento único na história do quilombo: “Nós fomos ouvidos de uma forma que nunca passou pela minha cabeça, estar na mesa outra vez. Lembro como era difícil acreditar na justiça quando se tratava da nossa comunidade. Uma comunidade tradicional, mas quilombola e caiçara ao mesmo tempo. No entanto, hoje já sabemos que a justiça funciona, sim, que podemos contar com a justiça, que podemos pedir socorro”.
O almirante Carlos Chagas destacou que o TAC permitiu conciliar três direitos constitucionais: à moradia, ao meio ambiente e à defesa nacional. E enalteceu a parceria que se formou entre a comunidade e a Marinha, especialmente na defesa do meio ambiente: “A comunidade é uma das grandes preservadoras do meio ambiente da Marambaia, junto com a Marinha, e graças a tudo isso, a gente mantém aquela ilha quase como num estado paradisíaco, que todos podem aproveitar”, afirmou.
Luta contra a discriminação racial – A segunda mesa do evento, que ocorreu após a roda de jongo, teve como tema o Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial, celebrado também no dia 21 de março. Participaram da mesa a procuradora da República Fabiana Schneider, curadora do Memorial da PR/RJ, o procurador da República Julio Cesar de Castilhos, a secretária-geral do MPF, a subprocuradora-geral da República Eliana Torelly, e a jornalista Flávia Oliveira.
Fabiana Schneider abriu a mesa agradecendo à comunidade da Marambaia pela parceria para a exposição: “Obrigada à comunidade da Marambaia por terem vindo, por esse espetáculo que vocês apresentaram e por esse período todo de história que a gente pôde viver aqui. E nós recebemos inúmeros visitantes de todas as idades e não teve quem não se encantou com a história da Marambaia, não teve quem não se emocionou com a história de vocês e com todas as possibilidades de temas e assuntos que nos permitiu tratar aqui dentro do Memorial”.
A jornalista Flávia Oliveira ainda ressaltou que o dia 21 de março é, desde 2023, também o Dia Nacional das Tradições das Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé. Ela ressaltou como há preconceito de cunho racial dirigido a essas religiões.
Eliana Torelly lembrou de questões que perpassam a defesa dos povos tradicionais. Lembrou, dentre outras coisas, do preconceito contra o povo cigano e da demora para demarcação de territórios tradicionais. Ela também abordou a questão povos indígenas transfronteiriços – como os Yanomami e os Guarani – que circulam entre países, o que, muitas vezes, acarreta dificuldades para o reconhecimento de seus territórios e direitos.
Júlio de Castilhos lembrou que o Brasil, enquanto Estado, defendeu práticas discriminatórias, como a Lei de Terras de 1850, que impediu que ex-escravizados fossem proprietários rurais, e a adoção de políticas imigratórias para embranquecer a população. “[O Brasil] É um país que se nega. O Brasil não se vê como um país afrodescendente”, afirmou.
A mesa tratou ainda da importância da exposição como forma de ocupação de um espaço dentro do MPF, colaborando para promover o reconhecimento dos povos tradicionais do país.
Assessoria de Comunicação Social
Procuradoria da República no Rio de Janeiro
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Fonte MPF