Direitos do Cidadão
12 de Dezembro de 2025 às 15h20
MPF aponta que União continua descumprindo decisão para implantar protocolos alternativos à transfusão de sangue no RJ
Manifestação destaca ausência de documentos essenciais e irregularidades em termos de consentimento e planos de treinamento

Foto ilustrativa: Tomaz Silva/Agência Brasil
O Ministério Público Federal (MPF) apresentou manifestação à 4ª Vara Federal do Rio de Janeiro para informar que a União não cumpriu as determinações impostas em tutela de urgência (liminar) que exige a implementação de protocolos e documentos padronizados relacionados ao manejo clínico de pacientes que recusam o tratamento de transfusão de sangue. A obrigação, fixada em sentença de abril de 2023, abrange hospitais e institutos federais da capital fluminense e inclui desde a padronização de protocolos de atendimento até a adoção de planos de treinamento pelos comitês transfusionais.
Segundo a manifestação, assinada pelo procurador regional dos Direitos do Cidadão adjunto no Rio de Janeiro Julio Araujo, mesmo após a reabertura de prazo determinada pela Justiça, a União não comprovou o cumprimento integral da decisão. Entre as pendências apontadas estão a ausência de Protocolos Operacionais Padrão (PBM) para o pré, intra e pós-operatório em diversas unidades, falta de protocolos de regulação e transferência de pacientes, além de irregularidades em Termos de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Alguns termos preveem a possibilidade de transfusão contra a vontade expressa do paciente – situação já vedada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Outras irregularidades – O MPF destacou que, no caso dos PBM, diversos hospitais não apresentaram qualquer documento, enquanto outros apresentaram versões incompletas, impossibilitando sua análise. Também foi registrada a ausência de protocolos de transferência na maioria das unidades, apesar da obrigatoriedade de garantir meios alternativos à transfusão, conforme entendimento do STF, que prevê que pacientes podem ser transferidos para unidades aptas a realizar tratamentos alternativos.
Outro ponto crítico é a inadequação dos TCLEs apresentados. Em alguns hospitais, os termos permitem, expressamente, a realização de transfusão mesmo em caso de recusa clara do paciente. Em outras unidades, não há termo específico para pacientes que optam por tratamentos alternativos, como determina a sentença. Para vários hospitais, nenhuma nova informação foi apresentada, mantendo-se o quadro de descumprimento registrado anteriormente.
Também não foram apresentados planos de treinamento dos servidores pelos Comitês Transfusionais, obrigação que deveria ter sido cumprida quatro meses após a sentença. O MPF aponta que nenhuma unidade apresentou comprovação de treinamento abrangendo todos os setores, inclusive administrativos. Em alguns casos, há apenas menções a cursos isolados ou palestras, sem comprovação de conteúdo programático ou abrangência.
Na manifestação, o MPF relembra que a multa diária de R$ 2 mil, fixada em decisão anterior, passou a incidir em 4 de novembro de 2025, após o fim do prazo reaberto pela Justjça. Considerando os 37 dias de atraso até a data da manifestação, o valor devido pela União soma R$ 74 mil, a ser destinado ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos.
O órgão também destaca que a União desistiu de sua apelação (recurso) no processo principal, o que tornou definitiva a obrigação de cumprir integralmente a sentença. Além disso, o agravo (recurso) interposto contra a decisão que fixou as multas não obteve efeito suspensivo no Tribunal Regional Federal da 2ª Região.
Diante do cenário de reiterado descumprimento, o MPF requer que a União seja intimada a recolher o valor acumulado das multas e a apresentar, em dez dias, novas informações detalhando as medidas adotadas para o cumprimento integral das obrigações impostas pelo juízo.
Hospitais e institutos – De acordo com a manifestação do MPF, os hospitais e institutos federais do Rio de Janeiro não comprovaram o cumprimento integral das determinações judiciais. O Hospital Federal de Ipanema apresentou protocolo incompleto e termos com previsão de transfusão contra o consentimento do paciente, além de não ter apresentado o termo específico para tratamentos alternativos. Já o Hospital Federal do Andaraí não enviou protocolo PBM, não apresentou novos TCLEs e tampouco comprovou plano de treinamento.
O Hospital Federal da Lagoa também não apresentou protocolo de transferência, exibiu termo que admite transfusão contra a vontade do paciente e não comprovou qualquer curso efetivamente realizado sobre PBM. O Hospital Federal Cardoso Fontes apresentou termos contendo previsão de transfusão compulsória e não demonstrou a existência de protocolo de transferência ou plano de capacitação.
O Hospital Federal de Bonsucesso não apresentou novas informações, permanecendo as pendências já apontadas sobre ausência de protocolo de transferência. O Hospital Federal dos Servidores não apresentou novos documentos em nenhuma das categorias exigidas, mantendo-se em descumprimento quanto aos protocolos, termos e plano de treinamento.
Quanto aos institutos, o Instituto Nacional de Cardiologia apresentou alguns avanços pontuais, como previsão de transferência em seu termo e menção a curso de segurança transfusional, mas sem comprovação de conteúdo e abrangência, e sem apresentar protocolo específico para transferência ou termo próprio para tratamentos alternativos. Por sua vez, o Instituto Nacional do Câncer já dispõe de procedimento fixo para transferência, mas não apresentou informações sobre o plano de treinamento exigido. Já o Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia não apresentou novos documentos relativos aos TCLEs ou ao plano de capacitação, mantendo o descumprimento anterior.
O MPF concluiu, portanto, que nenhum dos hospitais e institutos federais apresentou documentação capaz de comprovar o cumprimento integral da sentença.
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Fonte MPF

