MPF aponta criminalização de movimentos sociais em lei aprovada pela Assembleia Legislativa de Goiás — Procuradoria da República em Goiás

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Direitos do Cidadão

14 de Junho de 2024 às 14h25

MPF aponta criminalização de movimentos sociais em lei aprovada pela Assembleia Legislativa de Goiás

Norma sancionada em 2023 institui política estadual de segurança pública em rodovias e prevê medidas que restringem direitos fundamentais

A imagem mostra um grupo de pessoas sentadas em uma fileira durante o que parece ser um evento formal ou reunião.  Ao fundo, há uma parede vermelha com logotipos e texto que não estão totalmente visíveis devido ao ângulo e foco da fotografia. Também há uma tela de projeção exibindo algum tipo de apresentação com gráficos e tópicos. O cenário sugere um ambiente oficial ou corporativo, possivelmente envolvendo discussões ou apresentações sobre determinados temas indicados pela tela de projeção.


Fotos: Ascom PR/GO

O Ministério Público Federal (MPF) se posicionou contrariamente a lei aprovada pela Assembleia Legislativa de Goiás, que instituiu a política estadual de segurança pública nas faixas de domínio e nas lindeiras das rodovias estaduais, bem como das rodovias federais delegadas ao Estado de Goiás. A Lei nº 22.419 foi sancionada pelo governo do estado em 2023.

O posicionamento foi defendido durante o evento de lançamento, na última terça-feira (11), do relatório Conflitos no Campo em Goiás 2023, produzido pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) com análise de dados em relação a essas ocorrências registradas.

Para o MPF, a norma criminaliza previamente o direito de reunião, a liberdade de associação e a atuação dos movimentos sociais ao estipular a previsão de cruzamento de dados com benefícios de programas sociais como forma de intimidação de população vulnerabilizada, entre outras violações.

O integrante do Grupo de Trabalho da Reforma Agrária e Conflitos Fundiários da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, procurador da República Wilson Rocha Fernandes Assis, afirmou que: “Esta é uma lei que claramente criminaliza os movimentos sociais. É uma lei que.m causa estranhamento para porque identifica situações de fato não devidamente delimitadas, com o uso de termos imprecisos como “acampamento”e “movimento”, estipulando um rol de crimes praticados naquelas situações. É uma lei inconstitucional, inclusive porque priva o agente público da possibilidade de conhecer e interpretar a realidade, violando a independência dos poderes”.

O assunto está sendo discutido pelo GT, que elaborou nota técnica aprovada pela PFDC que expõe o entendimento do Ministério Público Federal sobre a lei estadual.

Wilson Rocha também frisou que há ação direta de inconstitucionalidade (ADI) em andamento no Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) e arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) em trâmite no Supremo Tribunal Federal (STF), questionando a mesma lei estadual.

Inconstitucionalidade – Conforme o posicionamento do MPF, o inciso VIII do artigo 3º da lei contraria o entendimento da Corte Interamericana de Direitos Humanos, valendo-se da presunção de criminalização do movimento social e autorizando, de forma abstrata e geral, medidas que restringem direitos fundamentais, sem qualquer análise prévia do princípio da proporcionalidade.

Já o artigo 4º, ao estabelecer um rol de crimes sem qualquer análise concreta de caso, e mediante presunção de ilicitude na atuação legítima de movimentos sociais, com vistas a inibir e intimidar a sua atuação, também é considerada inconstitucionalidade, no entendimento do MPF.

No artigo 5º, ao estabelecer a sanção de exclusão de benefícios de programas sociais, a legislação corrobora as inconstitucionalidades e ainda viabiliza o cometimento pelo gestor de ato com claro desvio de finalidade e atentatório à própria dignidade da pessoa humana.

Para Wilson Rocha, “a Lei nº 22.419 caminha no sentido contrário ao da promoção da cidadania, porque claramente visa desestimular que as pessoas reivindiquem direitos que estão previstos na Constituição”, disse.

Conflitos do campo em Goiás – De acordo com os dados divulgados pela CPT, Goiás é considerado o estado mais perigoso para as famílias camponesas da agricultura familiar no Brasil. O levantamento indica também 
A imagem mostra um homem moreno atrás de um púlpito com um microfone, vestindo uma camiseta verde. Ao fundo, há uma faixa com o texto “Conflitos no Campo”, indicando um evento ou discussão sobre disputas agrícolas ou de terras.que houve aumento em 108% de registros de conflitos no estado, que ainda registra, nos últimos dez anos, um aumento de conflitos de 35%, muito acima da média nacional (5%).

O relatório traz dados sobre os perfis de vítimas nos casos de violência contra ocupação e posse em Goiás no ano passado, com a população sem-terra (famílias que vivem em acampamentos para reivindicar acesso à terra por meio da reforma agrária) ocupando a primeira do ranking 79,6%. A íntegra do documento está disponível para download no site da CPT.

O evento da CPT deu voz a diversas lideranças de movimentos sociais como o Movimento Camponês Popular e o Movimento Sem Terra (MST), que expuseram as situações enfrentadas com abordagens policiais truculentas. “Já tem doze anos que estamos nessa luta. É humilhante chegar no acampamento, que para nós é a nossa casa, e encontrar tudo desfeito, como nós já presenciamos. O pessoal [do acampamento] estava fazendo curso no Senai e, quando chegaram (sic) lá, estava tudo cortado, quebrado, jogado fora”, relatou uma das lideranças presentes

Fonte MPF