MPF aciona Justiça e pede plano urgente de proteção contra agrotóxicos no Planalto Santareno (PA) — Procuradoria da República no Pará

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Meio Ambiente

4 de Agosto de 2025 às 18h40

MPF aciona Justiça e pede plano urgente de proteção contra agrotóxicos no Planalto Santareno (PA)

Ação aponta danos à saúde, contaminação de igarapés e desaparecimento de fontes de alimento para povos e comunidades tradicionais

Foto de trator agrícola ao pulverizar agrotóxico sobre uma plantação. O foco está na barra de pulverização com múltiplos bicos que liberam uma névoa fina sobre as folhas verdes.


Foto ilustrativa por fotokostic/Canva

O Ministério Público Federal (MPF) entrou na Justiça Federal, nesta segunda-feira (4), com uma ação para obrigar a União, o estado do Pará, a Agência Estadual de Defesa Agropecuária do Pará (Adepará) e o município de Santarém (PA) a elaborarem e executarem um plano emergencial para proteger as populações e o meio ambiente dos impactos da pulverização de agrotóxicos na região do Planalto Santareno.

O Planalto Santareno, localizado na região oeste do estado, fica a aproximadamente 42 km da área urbana de Santarém e é caracterizada pela expansão do agronegócio e pelo monocultivo de grãos. Na mesma região está a Terra Indígena (TI) Munduruku e Apiaká do Planalto Santareno, composta por cinco aldeias.

O objetivo central da ação é cobrar uma resposta efetiva dos órgãos públicos, com a elaboração urgente de um conjunto de normas que regulamente a atividade. O plano deve, necessariamente, estabelecer distâncias mínimas de segurança entre as áreas de aplicação de agrotóxicos e os locais onde vivem pessoas, como comunidades indígenas, quilombolas e de agricultores familiares, além de escolas, unidades de saúde e cursos d’água.

O plano ainda deve indicar coordenadores responsáveis, ações, prazos, metas e indicadores bem definidos e ter como conteúdo mínimo os seguintes itens:

  • a identificação de todas as comunidades (indígenas, quilombolas, ribeirinhas, extrativistas e camponesas) do Planalto Santareno.

  • o estabelecimento de distâncias mínimas de segurança entre as áreas de aplicação e núcleos populacionais (especialmente de comunidades tradicionais, como aldeias e quilombos), escolas, unidades de saúde, cursos d’água e outras áreas sensíveis.

  •  a realização de fiscalizações periódicas nos imóveis rurais que exerçam atividade agrícola na região do Planalto Santareno, sugerindo-se periodicidade mensal no primeiro ano. 

  • o monitoramento da saúde dos comunitários e dos cursos d’água, sugerindo-se periodicidade mensal no primeiro ano.

Após a aprovação do plano emergencial, o MPF pede que ele seja executado, sob supervisão judicial, e avaliado periodicamente, mediante relatórios trimestrais, até a sua conclusão por homologação judicial.

A ação é fruto de investigação que reuniu provas quanto ao risco aos quais pessoas e meio ambiente estão expostos. Um dos documentos centrais é um laudo pericial da Polícia Federal que constatou a proximidade excessiva das lavouras com as moradias. Os peritos encontraram plantações a apenas seis metros de casas na aldeia Açaizal e registraram a ausência total de barreiras de proteção, como faixas de segurança ou quebra-ventos. Imagens anexadas ao processo mostram caixas d’água comunitárias ao lado de plantações, e análises de solo revelaram a presença de três tipos de agrotóxicos: paration, alacloro e atrazina.

Omissão do poder público – Segundo o procurador da República Vítor Vieira Alves, autor da ação, a omissão dos órgãos públicos é um fato incontroverso. O MPF destaca que a própria Adepará admitiu oficialmente, em 2022, que não realizava fiscalizações no Planalto Santareno por “inexistência, na legislação estadual, de critérios específicos para distâncias mínimas na pulverização terrestre”. A Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) chegou a reconhecer a necessidade das medidas e a elaborar minutas de normas, mas, até o momento, não as aprovou.

O MPF aponta que essa inércia ocorre apesar de o uso de agrotóxicos na região ter crescido 600%, conforme dados citados na ação. A situação levou o Conselho Indígena Munduruku e Apiaká do Planalto (Cimap) a denunciar ao MPF que o veneno é carregado para os igarapés, contaminando fontes de água e os açaizais. Os indígenas relataram o desaparecimento de diversas espécies de árvores frutíferas essenciais para sua economia e cultura, como graviola, piquiá, uxi e pupunha.

Impactos avassaladores – Os danos à saúde são um dos pontos mais alarmantes citados na ação. Um estudo do projeto Institutos Nacionais de Ciência, Tecnologia e Inovação (INCT) – Observatório das Dinâmicas Socioambientais (Odisseia) revelou que 100% das análises de urina de moradores da região continham resíduos do herbicida glifosato. 

Outra pesquisa, da doutora em neurociências e biologia celular e professora na Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) Eliza Maria da Costa Brito Lacerda, apontou déficits na discriminação de cores entre os moradores, um indicativo precoce de efeitos neurofisiológicos.

Em depoimento ao MPF, a pesquisadora transcreveu relatos que demonstram a gravidade da exposição: “As pessoas relatam que elas sentem o cheiro dos agrotóxicos sendo aplicados. Elas sentem o sabor dos agrotóxicos quando eles estão sendo aplicados. […] Isso é um nível de exposição extremamente alto. É como se elas estivessem tomando eles, em gotas”.

Racismo ambiental – A ação cita ainda que 70% dos entrevistados em um estudo da doutora em toxicologia e professora da Ufopa Flávia Garcez da Silva apresentavam sintomas como cefaleia, vertigem e náuseas, além de alterações laboratoriais significativas, como dislipidemias. Um exemplo do perigo é o caso da escola municipal Professora Vitalina Motta, em Belterra (PA), que teve as aulas suspensas após uma “nuvem de veneno” invadir o espaço escolar.

O MPF argumenta que essa realidade configura um quadro de “racismo ambiental”, em que populações vulneráveis são desproporcionalmente expostas aos riscos, e um “verdadeiro genocídio cultural”, pois a degradação força o abandono de territórios e a perda de modos de vida tradicionais.

Pedidos de reparação – Além da elaboração do plano emergencial, a ação busca a reparação pelos danos já causados. O MPF pede a condenação dos réus à implementação de um plano de recuperação de áreas degradadas (PRAD). Requer também o pagamento de indenizações por danos morais coletivos e sociais, e o reconhecimento do direito à indenização individual para os moradores das comunidades afetadas desde o ano 2000. O valor total da causa foi estimado em R$ 900 milhões.

Processo 1017043-22.2025.4.01.3902

Íntegra da ação

Consulta processual

 

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Fonte MPF