Direitos do Cidadão
17 de Junho de 2024 às 8h55
Inspeção do MPF e DPU aos Centros Pop I e II revela desafios no atendimento à população em situação de rua em Maceió (AL)
Qualidade da comida e falta de atendimento e medicamento psiquiátricos são as principais reclamações; imóveis são inadequados para cumprimento de políticas públicas
Crédito: Comunicação MPF/AL
Na tarde da última sexta-feira (14), o Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU), com a participação de representantes da Secretaria Estadual da Mulher e Direitos Humanos (Semudh), realizaram uma inspeção nos Centros de Referência Especializado para a População em Situação de Rua, conhecidos como Centros Pop I (Jaraguá) e II (Levada), em Maceió/AL.
A visita, coordenada pelo procurador regional dos direitos do cidadão (PRDC), Bruno Lamenha, e pelo defensor regional dos direitos humanos (DRDH), Diego Alves, teve como objetivo verificar as condições de atendimento e acolhimento das pessoas em situação de rua assistidas por essas unidades. Apesar do importante papel que desempenham, a inspeção revelou diversas deficiências na infraestrutura e no serviço oferecido.
Condições Alimentares e de Higiene – Os Centros Pop I e II oferecem duas refeições diárias, café da manhã e almoço, podendo atender até 100 pessoas a cada refeição, por dia. No entanto, as refeições são a principal reclamação dos beneficiários do serviço. As refeições, preparadas pelo Restaurante Popular, são descritas como insossas e em quantidade pequena. A comida, embora não estragada, gera insatisfação entre os assistidos, especialmente por não haver uniformidade nas proteínas fornecidas.
Das 100 quentinhas diárias, foi informado que apenas 10 contêm galeto assado, 40 almôndegas e 50 carne moída de soja. Houve ainda denúncias de tratamento desigual na distribuição de alimentos e bebidas, com algumas pessoas recebendo café com leite enquanto outras recebem apenas café preto. Os usuários reclamam também que são impedidos de fazerem suas refeições no Restaurante Popular.
Nos banheiros das unidades faltam portas e, na unidade da Levada, foi flagrada a situação de falta de água. O material de higiene é racionado, com escassez de itens básicos como sabonete, pasta de dente e absorventes.
Atividades e Estrutura – As atividades recreativas e de interação social são limitadas. No Jaraguá foi dito que há jogos de dominó e baralho, além de jogo de futebol na praia duas vezes por mês, mas sem muita adesão. No Centro Pop da Levada, há um pouco mais de atividades, incluindo festas juninas e de Dia dos Namorados, além de artesanato com papel. No entanto, ambos os centros não possuem televisão e outras formas de entretenimento contínuo, o que faz com que muitos não permaneçam nos locais por falta de estrutura.
A falta de segurança também impede uma maior integração das pessoas com os equipamentos, isso por que, apesar dos Centros Pop terem seu funcionamento previsto para o período das 8h às 17h, só há acolhimento dentro das unidades enquanto há guardas municipais presentes. A Guarda Civil Municipal sai das unidades entre meio-dia e 13h, interrompendo assim a assistência interna aos usuários, os atendimentos passam a ser limitados, apenas através do portão, no caso do Centro Pop I, ou da janela, no Centro Pop II, sendo vedada a entrada para os beneficiários do serviço.
Apenas oito colchões estão disponíveis para descanso, número insuficiente para a quantidade de pessoas atendidas. Os usuários, que já enfrentam dificuldades para dormir nas ruas devido aos perigos, encontram poucas opções de repouso adequado nos centros. As dificuldades são agravadas pela ausência de ar-condicionado nas salas de atendimento do Centro Pop do Jaraguá, tornando o ambiente desconfortável para usuários e para trabalhadores, sendo todo desconforto elemento para tornar as relações ainda mais complicadas.
Problemas de Gestão e Acolhimento – As estruturas físicas dos Centros Pop são muito pequenas, imóveis residenciais adaptados que não possuem espaço mínimo para um acolhimento adequado de tantos usuários que necessitam. Sequer há espaço para guarda de pertences pessoais nas unidades, mas ambos mantêm arquivos com a documentação dos usuários. Também não foram identificadas saídas de emergência.
Há críticas à gestão municipal em relação à rede de acolhimento dessas pessoas, que têm dificuldade de serem acolhidas nos abrigos e não possuem auxílio psicológico, social e nem afetivo, agravando ainda mais a situação de vulnerabilidade à dependência química, quando é o caso.
Rafael Machado, um dos coordenadores do Movimento Nacional de Pessoas em Situação de Rua, destacou a dificuldade de acesso a medicamentos e a precariedade do acolhimento nas unidades. A falta de albergues suficientes e a negativa de serviços de acolhimento, frequentemente condicionados à apresentação de fotos, agravam a situação.
Atendimento à Saúde – O Centro Pop I recebe visitas quinzenais das equipes do Consultório na Rua e do programa Mais Saúde, em revezamento de semanas, enquanto o Centro Pop da Levada recebe visitas duas vezes por semana, para atendimento básico. Durante a vistoria realizada por MPF e DPU, a equipe do programa municipal Saúde da Gente estava realizando atendimentos, como: testes rápidos e vacinação, entre outros.
No entanto, muitos usuários não contam com acompanhamento médico regular e acesso a medicamentos, especialmente os numerosos casos de doença mental que necessitam de atendimento contínuo em centros de atenção psicossocial (CAPS). Os usuários do serviço reclamaram que em Maceió só tem um CAPS AD, localizado no bairro Farol, e os atendimentos são muito reduzidos, o que prejudica o atendimento de pessoas dependentes de álcool e outras drogas (AD).
Reivindicações e Dignidade – Os usuários dos centros expressaram a necessidade de serem tratados com dignidade, destacando que, apesar de estarem em situação de rua, são seres humanos com direitos. Eles reivindicam melhorias nas condições de atendimento, atividades recreativas, melhor qualidade e quantidade de alimentos, além de acesso adequado a serviços de saúde e higiene.
A inspeção do MPF e da DPU constatou a urgência de ações para aprimorar o atendimento nos Centros Pop I e II, garantindo condições dignas para a população em situação de rua em Maceió. A atuação conjunta das instituições está coletando todas as informações necessárias para buscar do poder público a solução para os problemas identificados e assegurar que os direitos dos cidadãos em situação de vulnerabilidade sejam respeitados e protegidos.
Atuação do MPF – Além da Notícia de Fato nº 1.11.000.000516/2024-09 que acompanha a situação da população de rua em Maceió/AL, no âmbito da qual foi realizada a vistoria, também tramita na PRDC o procedimento administrativo nº 1.11.000.001248/2023-53 instaurado para acompanhar a execução da Política Nacional para a população em situação de rua, em especial o cumprimento da liminar da ADPF nº 976, em Maceió (AL).
Na arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF), o Supremo Tribunal Federal, liminarmente, determinou que Estados e Municípios passem a observar, de forma imediata e independente de adesão formal, as diretrizes instituídas pela Política Nacional para a População em Situação de Rua (Decreto nº 7.053/2009).
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Fonte MPF