Meio Ambiente
29 de Outubro de 2025 às 12h55
COP30: ação do MPF busca maior rigor na prevenção de enchentes no Rio Grande do Sul
Chuvas em 2023 e 2024 levaram à decretação de calamidade pública em municípios gaúchos atingidos por rios que transbordaram

Enchente no município de Eldorado do Sul/RS. Foto: Bruno Peres/Agência Brasil, com adaptações
As enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul nos últimos anos levaram o Ministério Público Federal (MPF) a propor uma ação civil pública para buscar maior rigor na prevenção de enchentes no estado. De acordo com o MPF, “nos últimos cinco anos, ocorreram as quatro maiores enchentes dos últimos 50 anos nas cidades de Estrela e Lajeado”.
A ação foi apresentada à Justiça Federal menos de um mês após a catástrofe climática que atingiu o Rio Grande do Sul durante o mês de maio de 2024. Na ocasião, o MPF já alertava sobre o aumento da intensidade das chuvas e o consequente impacto nas cheias dos rios no estado, a partir das mudanças climáticas em andamento, cada vez mais visíveis em todo o planeta.
De acordo com o MPF, a frequência e a intensidade com que esses eventos climáticos extremos vêm ocorrendo indicam que as enchentes são resultado da desregulação do clima em decorrência do incremento massivo das emissões de gases de efeito estufa. Segundo a ação, “três das cinco maiores enchentes já registradas na região tiveram lugar nos últimos doze meses, considerado o lapso de mais de 150 anos, desde o registro da enchente de 1873”. Ou seja, em um século e meio desde o início das medições, no intervalo de um ano, ocorreram três das cinco maiores enchentes já registradas na região.
No entanto, o alerta mais visível já havia soado oito meses antes da catástrofe climática de maio. Chuvas intensas que atingiram o Vale do Taquari, na região central do estado, nos primeiros dias de setembro de 2023, motivaram a instauração de um inquérito pela Procuradoria da República em Caxias do Sul, na região serrana do estado. Naquele momento, o MPF já alertava para a necessidade de fiscalização e cobrança das administrações dos municípios atingidos a respeito de “ações preventivas no enfrentamento de situações climáticas extremas”.
As chuvas que caíram entre os dias 2 e 6 de setembro daquele ano elevaram o Rio Taquari à cota de 29 metros, 10 metros acima do limite de inundação e 16 metros acima do normal. A velocidade das águas arrastou casas e pontes, deixando um saldo de 54 mortos e 4 desaparecidos – o que levou o governo federal a decretar, na época, estado de calamidade pública em 79 municípios do Rio Grande do Sul.
No ano seguinte, a enxurrada que caiu em maio, ainda mais forte e volumosa, mobilizou quase todos os procuradores da República que atuam no estado. Os impactos das chuvas foram catastróficos e abrangentes, afetando cerca de 2,4 milhões de pessoas em 478 municípios, causando 183 mortes e prejuízos econômicos estimados na casa dos bilhões de reais. A situação levou à decretação de estado de calamidade pública em todo o estado.

Diante da situação, a ação civil pública estrutural proposta pelo MPF pretende estimular maior aproximação entre os entes federativos (União, estado e municípios) e a adoção das medidas previstas na Política Nacional de Proteção e Defesa Civil. A medida surgiu após o MPF constatar a insuficiência das ações de adaptação climática, prevenção e preparação contra desastres na região do Vale do Taquari. A ação é assinada pela procuradora da República Flávia Rigo Nóbrega e pelo procurador da República Fabiano de Moraes, que atuam em Caxias do Sul.
A ação busca a adoção de medidas imediatas, e de médio e longo prazo, junto a instâncias do poder público em relação aos danos causados pelos eventos climáticos ocorridos em 2023 (setembro e novembro) e 2024 (abril e maio).
Para os dois procuradores, as catástrofes resultaram da “ineficiência e da omissão governamental em relação às ações de adaptação climática, prevenção e preparação contra desastres”, além das responsabilidades estabelecidas nas Leis 12.340/2010 (organização e financiamento das ações de defesa civil em situações de emergência e calamidade pública) e 12.608/2012 (institui a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil) no Brasil. A norma estabelece o Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil (Sinpdec) e o Conselho Nacional de Proteção e Defesa Civil (Conpdec), autorizando a criação de um sistema de informações e monitoramento de desastres.
Na avaliação do MPF, embora a chuva seja um fenômeno natural, fatores de risco social como o despreparo das cidades, a desestruturação da Defesa Civil e a ausência de planejamento urbano contribuíram para ampliar os danos causados pelas enchentes. Além disso, o MPF argumenta que, além da Política Nacional de Proteção e Defesa Civil estabelecer que é dever dos entes públicos a adoção de medidas necessárias à redução dos riscos de acidentes ou desastres, ela já prevê que a incerteza sobre a ocorrência de desastres não pode ser usada como justificativa para adiar ações preventivas.

A ação civil pública estrutural foi a forma que os dois procuradores da República encontraram de garantir uma resposta mais ágil e eficiente dos pedidos feitos pelo MPF. “O processo estrutural visa reorganizar estruturas institucionais que perpetuam violações, não apenas corrigir comportamentos isolados”, explica a professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Juliana Cordeiro de Faria.
Nesse tipo de processo, há muito mais diálogo entre as partes do que uma decisão judicial, tendo como foco a busca de prazos e acordos entre as partes, sempre com o objetivo de se chegar a soluções duradouras, mediadas pela Justiça.
Dessa forma, o MPF pede não apenas que se façam planos de ação para reconstruir as áreas atingidas, considerando a necessidade de adaptação e resiliência climática que compreendam a participação social no planejamento e na execução das medidas, mas ainda ações preventivas de curto, médio e longo prazo, como:
• implementação de sistemas de alerta, como o cell broadcast;
• instalação de sirenes e aquisição de equipamentos de comunicação, como rádios amadores;
• mapeamento das áreas de risco;
• revitalização de áreas degradadas;
• proibição de ocupação em locais perigosos.


Em dezembro de 2024, o MPF realizou visitas técnicas e audiências de conciliação em cidades do Vale do Taquari (RS) afetadas pelos eventos climáticos de setembro e novembro de 2023 e abril e maio de 2024. O objetivo foi buscar soluções negociadas para a prevenção e preparação contra desastres, além de melhorar a adaptação climática na região. O MPF participou da visita aos municípios de Arroio do Meio, Bom Retiro do Sul, Colinas, Cruzeiro do Sul, Encantado, Estrela, Lajeado, Muçum e Roca Sales.
Com a presença de representantes dos governos federal, estadual e municipais, do MPF, do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul (MPRS), da Associação Nacional dos Atingidos por Barragens e de membros das comunidades locais, foram realizadas audiências de conciliação para tratar de questões específicas: critérios de definição das áreas que não poderão mais ser habitadas, medidas de preparação para novos eventos climáticos e habitação aos desabrigados.
A Ação Civil Pública Estrutural nº 5002380-17.2024.4.04.7114 foi ajuizada contra a União, o estado do Rio Grande do Sul e nove municípios: Arroio do Meio, Bom Retiro do Sul, Colinas, Cruzeiro do Sul, Encantado, Estrela, Lajeado, Muçum e Roca Sales.

Contagem regressiva – Até o dia 9 de novembro, véspera do início da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), em Belém, no Pará, serão publicadas 50 matérias sobre a atuação do Ministério Público Federal na proteção do meio ambiente, das populações mais vulneráveis e dos direitos humanos. A ação de comunicação faz parte da campanha MPF: Guardião do Futuro, Protetor de Direitos.
Acompanhe a contagem regressiva diariamente, no nosso site!
*Reportagem: Comunicação/MPF/RS
Fonte MPF


